O projeto de carro da Apple é rodeado de mistérios desde o começo. Além de informações muito escassas, a última reportagem a respeito do então Project Titan, não foi das mais animadoras.
Quatro assentos reclináveis, duas fileiras uma de frente para a outra, com telas grandes atrás dos assentos que somem automaticamente quando não estão em uso. O teto abobadado remete ao fusca. Sem volante ou pedais, existe ainda a possibilidade de haver um espaço de carga com acesso facilitado, em uma sistema “sobe e desce''.
Essas são informações sobre o suposto design do veículo, presentes em uma extensa reportagem do The Information, que contempla alguns detalhes sobre o desenvolvimento do carro da Apple, que acontece há 8 anos. Apesar das especulações do design “futurista”, ninguém jamais viu o carro, embora a Bloomberg tenha apontado para um estilo parecido com o Lifestyle Vehicle da Canoo:
Contudo, o máximo que se sabe é que os testes são feitos em modelos SUVs Lexus modificados, desde 2017. Mesmo que muitas histórias tenham surgido ao longo dos anos, a matéria foi ao ar em 11 de julho de 2022, e apresenta perspectivas mais concretas sobre os desafios da construção de um carro cujo objetivo é ambicioso: a direção autônoma em praticamente qualquer ambiente.
Com diversas informações internas, a publicação vai além do rumor, trazendo relatos de 20 pessoas que trabalharam diretamente no Titan, apresentando uma ideia consistente de como o plano vem progredindo ao longo desses anos.
Fontes indicam que mais de 200 especialistas começaram a trabalhar no “projeto secreto” em 2014, que a princípio seria um carro elétrico padrão. Contudo, os planos mudaram para o desenvolvimento de um veículo que não necessita de nenhuma intervenção do motorista, sendo assim, totalmente autônomo, um avanço considerável em relação a outros concorrentes como a Tesla.
Ainda em 2017, o CEO, Tim Cook, falou brevemente sobre o projeto, um momento raro, já que a empresa não costuma falar sobre o que está em desenvolvimento:
"Estamos focando em sistemas autônomos. É uma tecnologia central que consideramos muito importante. Nós a vemos como a mãe de todos os projetos de IA. É provavelmente um dos projetos de IA mais difíceis de se trabalhar."
Tim Cook, CEO da Apple
Para endossar o projeto, a Apple desenvolveu um chip de alta potência, considerado o componente mais avançado da empresa até hoje: baseado em processadores neurais, capazes de lidar com a carga de Inteligência Artificial que é demandada para veículos assim.
“A esperança é desenvolver um veículo que possa poupar os clientes da fadiga ao dirigir em viagens longas. Mas construir um carro de verdade, para um outsider da indústria automobilística como a Apple, exigirá parcerias.”
Bloomberg
Ao que tudo indica, a empresa também está construindo um novo design de bateria, com objetivo de reduzir seus custos e aumentar o alcance dos carros. Isso se dá a partir de um design “monocélula”, considerado o próximo nível quando se fala em baterias: "semelhante a primeira vez que você viu um iPhone", mencionou um ex-colaborador do projeto.
Até agora, tudo parece conspirar a favor do apple car, contudo, apesar das ideias inovadoras, desafios de gestão, conflitos constantes e até descrença por parte da liderança executiva, mostram-se fundamentais para o processo conturbado, dificultando que o carro saia do papel.
Em qualquer projeto, seja grande ou pequeno, o apoio da liderança executiva é sem dúvidas, um propulsor relevante e ao que tudo indica, é um ponto sensível no desenvolvimento do Titan.
Segundo a matéria, Craig Federighi, chefe de software da Apple e executivo-chave da empresa, e o CEO, Tim Cook, mantêm uma distância significativa do projeto, e são considerados pelos ex-colaboradores como “céticos”, visitando a operação raramente e visivelmente nada empolgados com plano.
Como mencionado anteriormente, o carro adotaria um modelo padrão de carro elétrico, até que os planos mudaram completamente. Essa situação vem acontecendo sistematicamente ao longo de muitas decisões-chave e desencadeando conflitos internos.
As definições inconsistentes impactaram todo o processo, desde quais tecnologias desenvolver e utilizar, até o design tanto interno quanto externo. Telas de realidade aumentada e sensores também foram amplamente testados. Em suma, todas as mudanças e percepções diferentes geraram atrasos de maneira contínua.
Ao longo do percurso, os executivos discordavam até mesmo em pontos fundamentais para o projeto, entre eles, se o carro deveria ser autônomo ou semi autônomo, por exemplo. Sendo assim, desde o começo, a falta de direcionamento e visão sobre o resultado final do apple car, levaram a momentos de estagnação.
Essa situação de incerteza e redefinição, não só desmobilizou a equipe, como fez com que fosse supostamente “ridicularizado” em outros setores da empresa, segundo a publicação do The Information.
Muitas pessoas passaram pelo projeto ao longo de 8 anos, inclusive lideranças. As diferentes visões sobre o carro, principalmente de quem possui um papel central, é uma consequência direta para andamento da processo.
Muitos executivo desistiram de guiar o Titan, e a perda mais recente foi Doug Field, que foi nomeado chefe de tecnologia na Ford. Anteriormente, o diretor de machine learning, Ian Goodfellow também saiu. Atualmente, o projeto está sendo orientado por Kevin Lynch, responsável pela criação do sistema Apple Watch.
Além disso, em 2019, a Apple comprou a startup Drive.ai, que projetou um serviço de transporte autônomo e contratou muitos de seus funcionários de engenharia e design de produto para trabalharem no projeto.
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Apesar da equipe estar especialmente direcionada para seu mais pleno desenvolvimento, o software está apresentando diversos problemas, entre eles o chamado “demoware”. Essa situação consiste em um problema muito comum em carros autônomos: o veículo desempenha como o esperado em rotas pré-determinadas, mas assim que muda para um percurso desconhecido, o motorista precisa assumir.
Em um dos testes no começo deste ano, o carro não parou para permitir que o pedestre atravessasse a rua, apenas reajustando o caminho ligeiramente, fazendo com que o motorista tivesse que frear. Essa é uma das informações mais problemáticas até então, porque indica que o software não conseguiu determinar se era um objeto parado ou em movimento.
A empresa concluiu que o veículo provavelmente teria atingido o pedestre sem a intervenção humana, e os testes foram suspensos até que essa falha fosse arrumada e a faixa de pedestres adicionada ao banco de dados.
Embora seja um desafio comum na indústria, o objetivo da empresa é que o carro alcance autonomia completa, e isso significa que ele deve funcionar de modo que não dependa de mapas perfeitos.
A Apple é uma empresa consolidada, e que possui um legado relevante através dos produtos que desenvolveu. Contudo, o Project Titan nos ensina algumas lições valiosas para qualquer negócio, inclusive, a importância de uma boa gestão, independente da maturidade do negócio.
Uma liderança inconsistente afeta não só os colaboradores como também, os projetos em andamento, e no caso do Project Titan, a troca contínua de líderes ocasionou uma situação de incerteza, múltiplos propósitos (inacabados), além de não promover direcionamento claro.
Não importa o tipo de liderança que você exerça, um bom líder ajuda os liderados a quebrarem barreiras, construindo um ambiente favorável para o desenvolvimento de soluções viáveis e colaborativas. Desse modo, o sucesso não está focado em ter todas as respostas, mas em fazer as perguntas certas e cativar o restante da equipe para que sejam capazes de contribuir com suas experiências pessoais.
Além disso, ter capacidade de execução, é uma das 15 lições de liderança mais importantes para qualquer líder. Sonhar com um produto e não ser capaz de produzi-lo é um erro que pode ser fatal, ou no mínimo, tende a estender o projeto até que fique insustentável dentro da companhia. Afinal, a iniciativa é importante mas a execução é ainda mais fundamental para atingir uma boa performance.
Com as diversas mudanças, foi ainda mais difícil manter o time alinhado, tanto com o projeto quanto uns com os outros. Nesse sentido, desenvolver um planejamento estratégico é essencial. Antes de iniciar qualquer ideia (ainda mais voltada à inovação), o ideal é ter clareza do objetivo, pois somente a partir de um norte bem definido, é que construímos o passo a passo para obter os resultados desejados.
Planejar nada mais é do que tentar traduzir onde queremos chegar, definindo um conceito, alavancas básicas para execução, objetivos alcançáveis e portanto entregáveis, iniciativas estratégicas e ações necessárias para implementação. Ou seja, constitui-se em sua essência, como um conjunto coordenado de ações e atividades, e um modelo de acompanhamento.
O processo de recrutamento e seleção é essencial para o sucesso de uma empresa ou projeto, contudo, é preciso investir em táticas capazes de reter esses talentos. Para isso, uma gestão estratégica de pessoas é fundamental.
“Você não constrói uma empresa. Você constrói um time, e o time constrói a empresa”
Zig Ziglar, autor, palestrante e vendedor
Um problema latente no caso da Apple, além da falta de direcionamento, é que em dado momento, grande parte dos envolvidos deixaram de acreditar no projeto, desvalorizando-o constantemente. Além disso, a diretoria executiva cada vez mais desengajada, acabou por validar esse comportamento. Afinal, apesar de qualquer palavra, a equipe tende a seguir exemplos.
Neste sentido, investir em uma comunicação eficaz, reconhecer resultados e implementar uma cultura de feedbacks estimula um ambiente de confiança, e é a base para diminuir o turnover de funcionários. Investir em capital humano é o melhor investimento de uma organização a longo prazo.
Geralmente, inovar significa correr riscos e até negócios que nasceram com essa mentalidade, passam por desafios. A Apple é uma das empresas mais inovadoras do mundo, e deixou um legado consistente para muitas gerações, mas o Titan é a prova viva de que nem uma das culturas organizacionais mais disruptivas, estão isentas de obstáculos.
Inovar é difícil, mas necessário. A inovação é capaz de garantir a evolução de um negócio, ajudando a identificar e antecipar comportamentos, dores e necessidades que influenciam sua sobrevivência, e conhecê-las é fundamental.
“Aproxime-se dos seus clientes mais do que nunca. Tão próximo que possa dizer a eles o que precisam antes deles mesmos perceberem.”
Steve Jobs, fundador da Apple
Entre desavenças, ceticismo e falhas preocupantes ao longo dos testes, o “apple car” está previsto para ser lançado em 2025, e a empresa está considerando soluções para disfarçar o protótipo e começar a realizar testes em público.
Além dos insights ao longo do artigo, o desenvolvimento do Project Titan demonstra o caminho percorrido pela gigante de tecnologia pela excelência, cuidando excepcionalmente de sua marca já consolidada, e principalmente, seu legado, mesmo que isso signifique uma saga de 8 anos em um único produto.
Embora buscar os mais altos padrões deva ser o propósito de todo negócio, à medida que temos objetivos ambiciosos, precisamos gerenciá-los ainda mais de perto, alinhando a equipe constantemente, de modo que todos trabalhem orientados por um caminho coerente, embasados em dados e com uma liderança assertiva, capaz de gerenciar estrategicamente.
Mesmo que o sonho seja ambicioso, é preciso se perguntar: é factível? E se não for, por inúmeras razões (no caso da Apple, é a tecnologia), há recursos suficientes para que seja? Independente da resposta, o maior recurso para um projeto se tornar tangível, são as pessoas. Afinal, sem as perguntas certas, não há como encontrar respostas.
Apesar dos desafios do veículo autônomo, a Apple já está caminhando para estar em todos os carros com o CarPlay. O programa facilita a conexão entre o sistema iOS nas centrais multimídia dos carros, e segundo a Apple, a próxima versão será executada em cada tela presente nos veículos, não só as destinadas a infoentretenimento.
Muitos negócios estão se mobilizando, sentindo-se pressionados a pensar sobre inovação, ainda mais aqueles que seguem modelos tradicionais. Embora não exista um caminho ideal, começar a pensar na inovação de produtos pode ser um dos caminhos para que seu negócio mantenha-se competitivo.
A Apple é uma empresa de tecnologia consolidada e mesmo que pareça distante da realidade do seu negócio, estamos caminhando para a chamada “low touch economy”, onde todas as organizações precisam ser mais digitais, ágeis e asset light do que nunca.
Nessa nova realidade, a máxima “inove ou morra” passa a ser aplicada a todos os setores. Se você deseja saber como explorar novos canais, práticas, frameworks e ferramentas de gestão conheça o G4 Traction do G4 Educação e torne o seu negócio ainda mais relevante.