Por décadas, startups levantaram capital com a esperança de escalar seus negócios para a alcançar a tão desejada avaliação de US$ 1 bilhão, momento onde a empresa atinge o status conhecido como unicórnio.
No entanto, por mais que boa parte das startups consigam seguir crescendo por meio de investimentos milionários, outras conseguem esse feito por meio de seus próprios esforços, injetando e investindo o lucro gerado pela própria empresa visando o crescimento do negócio ou contando com recursos dos próprios sócios.
Esse conceito é conhecido como bootstrapping, onde a startup possui uma capacidade de gerar receita, fluxo de caixa e alcançar o product market-fit sem a necessidade de recorrer a investidores externos.
Dito isso, por mais que algumas empresas tenham realizado pequenas rodadas de investimento em algum momento durante sua jornada inicial de escalar e crescer, elas utilizaram apenas seus próprios recursos até chegar lá, o que são feitos louváveis. Abaixo você encontrará 7 exemplos, tanto nacionais como internacionais, de bootstrap startup de sucesso.
Lançada em 2003 pelo desenvolvedor de software e fotógrafo amador Jon Oringer, o Shutterstock é conhecido como um dos primeiros websites de bancos de imagens.
Apesar de trabalhar como programador/codificador por interesse, Oringer tinha, assim como muitas pessoas com mentalidade empreendedora, uma necessidade de estar criando e testando.
De fato, Oringer estava sempre criando novos aplicativos e comercializando uma variedade de produtos para sua própria base de e-mail. No entanto, ele logo percebeu que os produtos contendo fotos anexadas eram os que vendiam melhor.
Apesar de obter um excelente insight para sua estratégia de vendas, fotos tinham um preço bastante elevado. Logo, do insight apresentou-se uma nova oportunidade de negócios.
Oringer decidiu utilizar sua própria câmera para obter as imagens que ele necessitaria para suas vendas. Feito isso, Oringer percebeu que, assim como ele, outros empreendedores na internet poderiam querer fotos de banco de imagens. Diante dessa possibilidade, ele juntou as 30.000 fotos que já havia tirado e as colocou em um site, porém cobrando uma assinatura mensal de US$49 para uso ilimitado.
A ideia teve uma alta aceitação e Oringer, consequentemente, teve que ampliar as operações do Shutterstock, realizando bootstrapping durante os primeiros 4 anos de vida da empresa.
“Eventualmente, fizemos uma pequena rodada de investimento [private equity] em 2007. Não foi porque precisávamos (a empresa praticamente se financiava), foi apenas um movimento de compensação de risco. Além disso, eu estava procurando um investidor que me ajudasse a escalar a equipe de gestão e construir os processos para transformar uma empresa de 40 pessoas em uma empresa de 200 pessoas.”
Em 2012, após quase uma década de seu lançamento oficial, o Shutterstock abriu seu capital na bolsa de valores e atualmente tem um valuation de US$3,3 bilhões, com Oringer mantendo uma participação de cerca de 50% da empresa, segundo publicado pela Forbes em 2020.
Por último, além de ser um grande exemplo de bootstrap startup, sobretudo por Oringer ser o único fundador, uma das principais razões que o Shuttestock nunca precisou levantar muito capital foi que a companhia atingiu rapidamente o product market fit, onde a demanda excedia a oferta de fotos oferecida por Oringer.
Fundada em 2001 por Ben Chestnut e Mark Armstrong, o Mailchimp atuava simplesmente como um serviço de email marketing, mas ao longo dos anos se tornou uma plataforma de marketing que oferece diversos recursos.
Chestnut e Armstrong administravam uma empresa de consultoria de design, mas recebiam demandas recorrentes de seus clientes para a criação de newsletters. Logo, para suprir a procura de forma mais assertiva, os dois decidiram criar uma ferramenta que facilitasse o desenvolvimento dessas newsletters.
Dito isso, apesar de ser sido lançado em 2001, o Mailchimp foi um negócio secundário para os fundadores até 2007, ano em que Chestnut e Amstrong finalmente decidiram encerrar as ativadas da consultoria de design e focar 100% de suas energias na Mailchimp, que já contava com 30.000 clientes pagantes.
Inicialmente, a Mailchimp era um serviço totalmente pago, porém, em 2009 tiveram que ajustar e passar a oferecer um modelo freemium para ajudar a enfrentar a recessão nos Estados Unidos (2007-2009). Contudo, em apenas uma ano, essa mudança ajudou a empresa a ampliar seu número de usuários de mais 100.000 para 450.000.
Desde então, a Mailchimp manteve seu modelo freemium como estratégia de growth.
Analisando a empresa como exemplo de bootstrap startup, a Mailchimp não teve a necessidade de realizar nenhuma rodada de investimentos e viu sua receita aumentar de US$250 milhões em 2015 para US$800 milhões, segundo dados divulgados pelo New York Times e pela Forbes.
Por último, em setembro de 2021 foi anunciada compra da Mailchimp pela Intuit por US$12 bilhões. Quando anunciada a compra, a Mailchimp contava com cerca de 13 milhões de usuários que, segundo a própria empresa, tiveram mais de 515,3 milhões de pedidos de e-commerce em 2020, o que resultou em US$61 bilhões em receita.
No quesito empreendedorismo, existem duas curiosidades que muitos desconhecem sobre a desenvolvedora de video games sueca Mojang Studios:
Fundada em 2009 por Markus Persson, o sucesso do Minecraft foi tão iminente que, em 2014, a Mojang foi comprada pela Microsoft por US$2,5 bilhões. Dito isso, listamos alguns números importantes desses primeiros anos da empresa:
Em setembro de 2014, quando anunciada a aquisição pela Microsoft, o Minecraft já tinha uma base estimada em cerca de 100 milhões de usuários e havia vendido em torno de 50 milhões de cópias. Esses resultados foram obtidos pela Mojang com um time composto por 40 pessoas, segundo a The Hollywood Reporter.
Vale ressaltar que a alta lucratividade, popularidade e escalabilidade do Minecraft foram obtidos por conta da “natureza de mundo aberto” e os mecanismos de criação do jogo que, ao oferecer esse tipo de flexibilidade, é apreciado por um público-alvo mais amplo, desde crianças a adultos.
Essa amplitude em seu público-alvo fez o que Minecraft não só fosse jogado por mais pessoas como teve um compartilhamento em massa por meio de influenciadores em plataformas como Twitch e ouTube –Minecraft ultrapassou a marca de 1 trilhão de visualizações no YouTube entre todos os conteúdo relacionado ao jogo.
Quando se fala sobre startups, sobretudo entre os que trabalham/criaram uma ou os simpatizantes do tema, é comum pensar primeiro em companhias criadas no Vale do Silício. Afinal, segundo a Startup Ranking, os Estados Unidos são o país com maior número de startups no mundo (70,762), seguido de Índia (12,556) e Grã Bretanha (6,155) –como curiosidade, o Brasil ocupa a 10ª posição (1,164).
Dito isso, apesar de que o sucesso de startups americanas possam haver tido uma repercussão muito mais expressiva a nível global, existem diversas startups exitosas que tiveram sua origem em outros países e que possuem uma alta relevância fora de seus territórios, como no caso da australiana Atlassian.
Lançada em 2002, a companhia fundada por Mike Cannon-Brookes e Scott Farquhar se tornou uma das empresas de tecnologia de maior sucesso nos últimos anos com produtos como Jira (produto que permite o rastreamento de bugs e gerenciamento ágil de projetos) e Trello (ferramenta de gestão de trabalho) em seu portfólio.
Um dos fatores de sucesso da Atlassian foi a construção de um software de acompanhamento de projetos que tem sido incorporado ao DNA da maioria dos sistemas técnicos. Além disso, a empresa se concentrou em criar um produto inteligente e intuitivo que não exigisse nenhuma equipe comercial para vender.
Além disso, ao oferecer um período gratuito de teste para os usuários –e causar uma boa impressão– o boca a boca foi aumentando e esses usuários passaram a convidar outros membros de suas equipes e amigos de outras empresas para a plataforma.
Uma vez que mais membros da mesma equipe se encontravam integrados na plataforma, mais difícil seria trabalhar sem as ferramentas e, ao implementar um modelo de distribuição de baixo custo, a Atlassian escalou rapidamente.
A Atlassian passou os primeiros 8 anos realizando bootstrapping e, em julho de 2010, foi anunciado que a empresa receberia um aporte de US$60 milhões da venture capital Accel Partner. Na época, a Atlassian empregava 225 funcionários e possuía mais de 20.000 clientes em 140 países –incluindo Microsoft e Facebook–, tendo registrado US$59 milhões de receita para o ano de 2009.
Em 2015, a Atlassian realizou seu inicial public offering (IPO) na bolsa de valores NASDAQ e alcançou um valor mercado de US$4,37 bilhões –hoje, o valuation da empresa está acima dos US$70 bilhões. Em 2021, a empresa teve US$2,089 bilhões de receita.
Em 2004, os canadenses Tobias Lütke, Daniel Weinand e Scott Lake usaram a internet para começar a vender equipamentos de snowboard abrindo uma loja chamada Snowdevil.
Na época, as plataformas de e-commerce existentes para a loja online não eram satisfatórias, e Lütke, um programador de computador, decidiu construir sua própria plataforma de e-commerce.
Logo, após dois meses de desenvolvimento, o Snowdevil foi lançado e, em 2006, a plataforma que hospedava o Snowdevil foi anunciada como Shopify, preenchendo o nicho para o tipo de plataforma que seus fundadores buscavam.
O envolvimento da Shopify no comércio eletrônico cresceu rapidamente e, em 2009, eles criaram sua interface de programação de aplicações (API), que permitia que aplicativos específicos da Shopify fossem vendidos em sua App Store.
Nesse mesmo ano, a empresa divulgou que, desde o lançamento do sistema de carrinho de compras em 2007, os varejistas na plataforma da Shopify faturaram um total combinado de US$100 milhões em vendas.
Em 2010, eles foram ainda mais longe ao trazer a Shopify para dispositivos móveis, adicionando um aplicativo da Shopify à Apple App Store. A partir daí, os proprietários de empresas puderam visualizar e gerenciar suas lojas Shopify em seus dispositivos favoritos.
No final do mesmo ano, a Shopify levantou uma rodada de financiamento no valor de US$7 milhões da Bessemer Venture Partners, FirstMark Capital e Felicis Ventures. Alex Ferrara, sócio da Bessemer, juntou-se ao conselho da Shopify –na época, a Shopify tinha aproximadamente 21.000 lojas que faturaram um total de US$124 milhões em todo o mundo, segundo divulgado pela Entrepreneur.
Após 5 anos, em 2015, a empresa canadense debutou na bolsa de valores de Nova York (NYSE) e atingiram um valuation de US$1,27 bilhões. Hoje, com um valor de mercado acima dos US$78 bilhões, o Shopify está presente em 175 países, possui mais de de 1,7 milhão de empresas em sua plataforma e teve uma anual de US$4,6 bilhões em 2021.
Em 2014, o publicitário Alfredo Soares e o engenheiro de software Ricardo Oliveira decidiram mudar o rumo do seu negócio à época –uma agência chamada Marketing Shop– e apontar para o e-commerce, especificamente em plataformas padronizadas para lojas virtuais.
Dito isso, por conta de já existirem competidores estabelecidos nesse setor como, por exemplo, Loja Integrada e Nuvemshop, um dos diferenciais oferecidos pela Xtech foi uma oferta de múltiplas soluções de marketing e vendas que seriam integradas à plataforma original.
“Apresentamos nossa solução e conseguimos 50 clientes, mesmo sem ter o produto terminado. Contratamos um telefone 0800 para as pessoas acharem que tínhamos uma central de atendimento, mas era apenas um funcionário atendendo mesmo.”
Além disso, aproveitando-se da experiência de marketing conseguida nos anos prévios à Xtech, Alfredo e Ricardo optaram por adotar o boostrapping para o crescimento da empresa e não depender de nenhum investimento externo. De fato, a Xtech é um dos exemplos de sucesso mais recentes de boostrap startup no Brasil.
A estratégia escolhida que centrava as atenções de growth no marketing, com um serviço que solucionava a dor de diversos clientes ao redor do Brasil, junto à liderança de Alfredo, contribuíram para um rápido crescimento nos dois primeiros anos de empresa.
A Xtech passou de 1.500 clientes em 2015 para mais de 50 lojas virtuais abertas por dia em dezembro de 2016 –incluindo algumas nos Estados Unidos–, ano onde a empresa conseguiu transacionar R$3 milhões na Black Friday.
Após 3 anos, com 40 mil lojas criadas e chegando a faturar R$ 350 milhões em um ano, a Xtech foi adquirida pela VTEX por R$ 14 milhões.
Hoje, Soares, que passou a ocupar o cargo de presidente da Loja Integrada após a aquisição pela VTEX, fala sobre sua experiência na Xtech com o intuito de ensinar a outras pessoas sobre como criar uma boostrap startup.
Dito isso, em abril de 2019, Alfredo lançou o G4 Educação junto a Tallis Gomes, Bruno Nardon e Tony Celestino, empresa que faturou R$ 50 milhões em 2021 e possui um time de mais de 150 pessoas.
Inclusive, o G4 Educação tem como meta triplicar seu faturamento no ano de 2022, ainda seguindo o modelo bootstrapping.
Fundada em 2012 na cidade de Florianópolis, a Decora é um dos maiores casos de boostrap startup no Brasil.
Seus fundadores, Paulo Orione e Gustavo do Valle, na época dois estudantes de administração, não possuíam nenhuma experiência na área em que a Decora atuaria: arquitetura e decoração.
Dito isso, a empresa teve que modificar seu modelo de negócios duas vezes antes de encontrar o que facilitaria a sua escalabilidade.
Começaram como um marketplace para decoradores, se aproximaram de e-commerces que utilizavam materiais criados por designers, para por fim investir no aprimoramento da tecnologia da plataforma da Decora e na captação de profissionais especializados –até internacionais– para auxiliar na criação desse tipo de conteúdo, com foco na ambientação de produtos.
De fato, esse foco no produto também foi parte de uma estratégia adotada pelos fundadores, pois mesmo durante o crescimento da empresa, o nome Decora ainda não tinha tanta presença na mídia, uma desvantagem caso estivessem procurado investimentos externos.
Em 2015, a Decora conseguiu entrar no mercado norte-americano, o que foi fundamental para o futuro da empresa que, em 2017, tinha 90% de seu faturamento proveniente dos Estados Unidos.
“Um dos nossos sócios, que entrou depois no negócio, foi morar em Miami e participamos de um programa do Sebrae, o Exporta SC. Fechamos com um grande cliente e reservamos uma grana para investir em feiras lá nos EUA durante quatro meses. Deu certo e no final daquele ano [2015] já estávamos capitalizados para crescer no mercado americano sem precisar de investidor.”
Em 2017, a empresa foi de 20 funcionários a 130, registrou um crescimento de 1000% no volume de produção de imagens ambientadas, possuía um rede internacional com mais de 4.000 designers e arquitetos e começou a chamar atenção de investidores de peso, sendo um deles o Pinterest.
Logo, em 2018, a startup catarinense, que se manteve fora dos holofotes por boa parte de sua jornada de crescimento, ganhou a presencia midiática tão ansiada por outras startups, mas neste caso foi para anunciar a sua aquisição pela empresa americana Creative Drive por US$100 milhões –a Decora, na época, faturava em média US$1 milhão por mês.
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