Quando falamos sobre a indústria entretenimento na última década, existem poucas empresas que disruptaram tanto o mercado como o fez a Netflix. No entanto, nós últimos anos, a empresa vem sendo responsável por outro fenômeno, o Efeito Netflix, que não só vem transformando a vida de atores como também a de produtos e marcas presentes em suas produções.
Na mente do assinante, esse efeito certamente teve uma evolução. Desde ter visto alguma produção, seja ela uma série ou filme, pela primeira na Netflix, até o reconhecimento de algum ator/atriz em outras produções após haverem sido lançados ao estrelato por meio da plataforma, até comprarem algum produto visto em alguma produção popular da Netflix.
Hoje, é possível ver que a Netflix se tornou muito mais do que um veículo que proporciona entretenimento de qualidade e em grande quantidade, para todos os gostos e para todas as idades. Hoje, do mesmo que jeito que o Big Brother tem sido uma grande exposição de marca para os brasileiros, a Netflix é uma gigante vitrine para atores e marcas, porém a nível global.
Em termos de assinantes globais, são 222 milhões e uma presença em mais de 190 países. No Brasil, segundo maior mercado da Netflix, são mais de 18 milhões.
Se antes o efeito Netflix ocorria primordialmente no lançamento/divulgação de atores/atrizes, produtores, roteiristas, diretores e outros profissionais do meio, hoje esse efeito vem sendo cada vez mais frequente no resultado de certos produtos e marcas –que não necessariamente pagam por estar presentes nas produções do streamer.
Por conta disso, decidi separar aqui alguns dos últimos e mais relevantes casos de como esse efeito Netflix tem surtido efeito no varejo.
O efeito Netflix, no geral, é usado para se referir a uma série de coisas diferentes, desde catapultar atores para a fama “da noite para o dia” até a maneira como isso mudou a forma como vemos a indústria da TV e do cinema.
No caso de atores e atrizes, assim como mencionado, essa “fama” pode ser a nível local como também internacional.
No entanto, nos últimos anos, por conta da popularidade de diversas produções internacionais como, por exemplo, La Casa de Papel (Espanha) e a recente Round 6 (Coreia do Sul), atores de países que não tem o inglês como principal idioma vem ganhando notoriedade na indústria norteamericana, a principal deste mercado.
No contexto do varejo, o efeito Netflix refere-se a determinados produtos que aumentam as vendas como resultado direto de serem apresentados em um programa ou filme da Netflix, bem como o desenvolvimento de tendências de pesquisa, seja via Google, eBay ou Amazon.
No final de junho de 2020, a Nike divulgou seus números do quarto trimestre e o resultados do último ano. Assim como muitas marcas, a empresa observou uma queda de receita por conta do fechamento de lojas físicas e, no caso da Nike, esse declínio foi observado em 6 das 7 principais categorias da empresa.
A exceção no caso: a marca Air Jordan, parceria do ex-astro do basquete Micheal Jordan e a Nike desde 1984 e que rendeu ao ex-jogador do Chicago Bulls entorno de US$1,3 bilhões nesses quase 40 anos de colaboração.
No caso do ano finalizado na metade de 2020, a marca teve um aumento de 15% e uma receita de US$3,6 bilhões. Segundo John Donahoe, CEO da Nike, boa parte desse aumento, sobretudo no quarto trimestre, se deve a popular minissérie-documentário de 10 episódios “Arremesso Final (The Last Dance)”, que teve sua estreia no dia 19 de abril na ESPN e dia 20 de abril na Netflix.
O "The Last Dance", parceria entre a ESPN (retentora da distribuição e exibição nos Estados Unidos) e a Netflix (distribuição e exibição internacional), forneceu uma visão aprofundada da dinastia dos Chicago Bulls focando suas atenções na temporada de 1997-1998, última do time liderada por Jordan.
A produção estava originalmente programada para ser lançada no final de junho, mas a ESPN decidiu adiantar o lançamento para abril por conta que, naquele momento, não haviam esportes ao vivo sendo transmitidos.
Nos Estados Unidos, a série teve uma média de 5,6 milhões de telespectadores por episódio.
Focando-nos exclusivamente no impacto que a série teve em certos produtos, só no Brasil, as vendas de artigos de vestuário do Chicago Bulls cresceram em 650% se comparados ao período de abril e maio do ano anterior.
Além disso, em maio de 2020, a CNBC publicou uma nota dizendo que, após a estreia da minissérie na Netflix e na ESPN, as vendas de praticamente todos os produtos associados ao ícone do basquete e do esporte mundial alcançaram novos patamares.
De fato, em um leilão online do maior e mais confiável marketplace do mundo para arte e luxo, a Sotheby’s, um par autografado do modelo Air Jordan 1 –presença ilustre na série– foi vendido por US$560.000.
A popularidade do programa também ajudou a que comércios como, por exemplo, o marketplace de calçados StockX, de Detroit, Michigan, batessem recordes de vendas –pares da versão não autografada do Air Jordan estavam sendo vendidos, em média, por US$7.123.
“Antes da exibição do documentário, a última venda desse modelo foi em 2017 e, na época, ele era vendido por US$3.000. Assim, estas últimas vendas representam um aumento de mais de 100% no valor de revenda. As vendas de tênis da marca Jordan aumentaram em 38% e estão levando os fãs ao nosso site.”
Jesse Einhorn
Economista sênior na StockX
Segundo a GumGum, empresa de dados e inteligência, a marca Nike e Air Jordan receberam mais de nove minutos de exposição em um único episódio –no caso, o quinto episódio da série–, um valor equivalente a US$487.000.
A Fanatics, principal varejista online de roupas e mercadorias esportivas licenciadas, divulgou que, desde a estreia do minissérie-documentário, mercadorias relacionados a Michael Jordan tiveram um aumento de 900%.
Por mais impressionantes que os números acima sejam, quando você combina a força que o nome Michael Jordan carrega, combinando a nostalgia de reviver alguns dos momentos mais importantes de um dos maiores ídolos do basquete, junto a falta de esportes ao vivo por conta da pandemia, pode-se dizer que o sucesso da minissérie era praticamente certo.
Dito isso, ainda falando sobre esportes, hoje podemos dizer que o efeito Netflix vai muito mais além dos esportes convencionais. Neste caso, o esporte em questão é o xadrez e a produção Netflix responsável por esse efeito é o “O Gambito da Rainha”, vencedora dos prêmios Emmy, o Óscar dos seriados.
Estreada em 23 de outubro de 2020, a série limitada de 7 episódios foi assistida por 62 milhões de pessoas em suas primeiras 4 semanas, tornando-a, na época, como a mais assistida da Netflix neste formato.
Baseado no romance de mesmo nome de 1983, “O Gambito da Rainha” segue Elizabeth Harmon, uma jovem que começa uma carreira no xadrez no porão de um orfanato em Kentucky e rapidamente passa para coisas maiores, tornando-se uma das principais jogadoras a nível global.
Após o sucesso de “O Gambito da Rainha”, o chess.com, rede social e site de xadrez adicionou 2,8 milhões de novos membros em novembro, um mês após a estreia da série limitada na Netflix.
Segundo o jornal britânico Metro, após 10 dias da estreia do programa, a pesquisa por tabuleiros de xadrez no eBay aumentou em 273%.
Em entrevista à National Public Radio, Mary Higbe, diretora de marketing da Goliath Games, disse que embora as vendas de xadrez em outubro de 2020 tenham aumentado 178% em relação ao ano anterior, o lançamento de “O Gambito da Rainha” no final de outubro catapultou um aumento nas vendas de 1.048% em relação a 2019.
O grupo de pesquisas NPD reportou que, três semanas após o lançamento da série, a venda de tabuleiros de xadrez aumentaram em 87% e a venda de livros sobre o esporte tiveram um salto de 603% no mesmo período.
“A ideia de que uma série de televisão em uma plataforma de streaming possa ter um impacto na venda de produtos não é algo novo, mas nós finalmente podemos ver esse fenômeno através de dados. A venda de livros e tabuleiros de xadrez, que há anos estavam estagnadas ou em declínio, aumentaram acentuadamente à medida que nova série popular ganhava mais espectadores"
Juli Lennett
Consultora da indústria de brinquedos do grupo NPD
Assim como mencionado, a Netflix passou a ser uma grande vitrine global para produções e atores de Hollywood, mas também para criadores de mercados com menor visibilidade, mercados mais locais.
Filmes, séries e documentários de países de língua não inglesa foram, pouco a pouco, ganhando mais visibilidade entre os milhões de assinantes do serviço de streaming, chegando a figurar no topo dos rankings da Netflix de países como Estados Unidos e Reino Unido.
Dito isso, no dia 17 de setembro de 2021, mais uma produção sul-coreana ganhou destaque no mundo do audiovisual, a série Round 6, a mais vista da história a Netflix, vista por 142 milhões de contas em seus primeiros 28 dias, equivalente 1,65 bilhões de horas assistidas.
Em outubro de 2021, a revista Variety publicou uma matéria falando sobre o efeito Netflix que a série teve em determinados produtos.
Na nota, foi divulgado que, além do incremento de buscas por fantasias inspiradas pelo moletom verde e branco utilizado pela maioria dos personagens, as vendas dos tênis brancos da marca Vans (também utilizado por quase todos os personagens) aumentaram em 7.800% desde que a série estreou no serviço de streaming, de acordo com dados fornecidos pela Sole Supplier.
As vendas de Dalgona –conhecido também como Ppopgi–, doce coreano apresentado no programa, tiveram alta, com um fornecedor relatando um aumento de 250% nas vendas.
Yong-Hui, produtor de Dalgona para a Round 6, disse que vendia 200 doces por dia antes que o show debutasse na Netflix no dia 17 de setembro. No entanto, no começo de outubro, ele disse que esteve vendendo mais de 500 por dia por mais ou menos US$1,68 cada um.
As vendas do doce clássico subiram 343% no popular site de compras coreano Gmarket.co.kr desde de 17 de setembro até 11 de outubro, em comparação com o mês anterior. As vendas também subiram 351% no varejista online Auction.co.kr.
Neste caso, podemos ver que, além de peças de vestimenta –independente se são de marcas conhecidas ou não–, o efeito Netflix também reflete em produtos cotidianos, podendo alavancar e reerguer certos produtos típicos de uma região, e apresentá-los para outros públicos.
Seguindo nessa linha, apesar do efeito Netflix ter um alcance muito maior e, por conta disso, permitir que públicos de diversos países e de cidades fora das grandes metrópoles tenham acesso a muito mais conteúdo de qualidade, esse fenômeno já foi observado anteriormente.
Para exemplificar, um fenômeno parecido ocorreu com o filme sul-coreano Parasita, de 2019. Neste caso, o filme não figurava em nenhum serviço de streaming, porém já ganhava fama nas premiações de cinema, o que lhe proporcionou uma acordo de distribuição em mercados importantes.
No entanto, a qualidade, a relevância e a popularidade do filme entre diversos críticos de cinema fizeram com que sua janela de exposição ficasse cada vez maior e mais ampla, com mais salas de cinema oferencendo o filme. Meses depois, Parasita não só concorreu a inúmeros prêmios da indústria do cinema, como se consagrou vencendo o Óscar de “Melhor Filme” em 2020.
Durante toda essa jornada, culminada na principal premiação do setor, as ações da marca de macarrões instantâneos coreana Nongshim Co aumentaram; neste caso, um dos personagens do filme cozinhou dois de seus produtos chamados Chapagetti and Neoguri.
As vendas de Nongshim no exterior tiveram um aumento anual de 24% em 2020, equivalente a US$990 milhões, depois que o filme recebeu o Oscar de "Melhor Filme".
A empresa acredita que a popularidade de "Parasita" contribuiu para o então desejo por seus macarrões instantâneos. Fora isso, o impacto do filme também repercutiu na Coreia, com um aumento de 60% nas vendas domésticas dos dois produtos nos três dias seguintes à vitória do Oscar.
Dito isso, com a facilidade e o acesso oferecido por serviços de streaming como a Netflix, efeitos de popularidade podem se tornar cada vez mais comuns, mesmo em produções estrangeiras.
Outra série de época que impulsionou a venda de diversos produtos foi a atual segunda série mais assistida da Netflix (82 milhões de pessoas), Bridgerton, série dramática situada durante a Regência Britânica no Reino Unido e Irlanda entre 1811 e 1820.
Desde sua estreia em 25 de dezembro de 2020, as marcas de corpetes/cintas tiverem um aumento em seus negócios. De acordo com a Orchard Corsets, o tráfego para seu site cresceu 71%, enquanto o Corset Story teve um aumento de 20% no tráfego do site em janeiro de 2021.
A Etsy, marketplace online especializado na compra e venda de produtos artesanais, viu um aumento de 91% nas pesquisas por “corpetes” entre dezembro de 2020 e fevereiro de 2021, bem como um aumento semelhante nas pesquisas por itens inspirados na série como, por exemplo, conjuntos de chá, que aumentaram 110%, e luvas de renda, que subiram 744%.
Outra série que também impulsionou a venda de produtos foi “Emily em Paris”. Dito isso, detalhamos o aumento no número de buscar/vendas de certos artigos que são bastante utilizados em sua primeira temporada:
Por último, graças ao “The Home Edit - A Arte de Organizar”, série que estreou no final de agosto de 2020 e mostra como duas organizadoras profissionais ajudam a “estruturar” as casas de celebridades, a The Container Store experimentou um aumento em seus negócios após o lançamento do programa.
A marca também teve um aumento considerável no preço das ações desde que “A Arte de Organizar” chegou à Netflix. De 9 a 21 de setembro, o preço das ações da Container Store Group Inc. quase dobrou, saltando de US$ 3,73 para US$ 6,58.
Documentários esportivos não são algo novo para a Netflix, mas nos últimos anos vem ganhando cada vez mais popularidade, catapultado pelo sucesso da primeira temporada de F1: Dirigir para Viver (Formula 1: Drive to Survive), que estreou em março de 2018.
A série catalisou o interesse da Netflix em documentários esportivos e o interesse das entidades esportivas perante a plataforma de streaming. Dito isso, a primeira temporada alcançou os fãs mais ávidos do esporte, mas essa audiência cresceu nos últimos anos.
Após 3 temporadas, a tese da Netflix, em conjunto a Liberty Media, dona da Fórmula 1, foi provada: os índices de audiência da Fórmula 1 na televisão subiram cerca de 40% nos EUA desde a estreia de “Drive to Survive”.
Isso também demonstra que o efeito Netflix não se limita a produtos e atores/atrizes, mas também influencia na popularidade de certos esportes em regiões onde estes não são tão populares.
Agora, a Netflix pretende criar fenômenos parecidos com outros esportes como golf e tênis, este último terá sua série produzida pelos mesmos responsáveis da produção sobre Fórmula 1.
No dia 20 de janeiro, a Netflix divulgou seus números referentes ao último trimestre fiscal, mostrando um aumento no número de assinantes globais mesmo depois do aumento no preço da assinatura em certas regiões.
A empresa teve um trimestre muito forte de novos lançamentos, com quatro das cinco séries originais mais procuradas no último trimestre, de acordo com a Parrot Analytics. (Também teve alguns filmes de sucesso, que o Parrot ainda não mede). Apesar de toda a nova competição, os programas da Netflix ainda representam quase metade do que as pessoas querem assistir.
Com esse aumento de assinantes, podemos dizer que o efeito Netflix terá uma escala ainda maior e, após todos os exemplos citados, mostra como outras marcas buscarão inserir seus produtos, mesmo que de forma discreta em produções da plataforma.
A Netflix, assim como outros serviços de streaming, passou a ser considerado não só essencial como fonte de entretenimento (e até conhecimento), mas também como uma oportunidade de marketing devido ao seu alcance global.
Hoje, o nome efeito Netflix pode ser o que predomina, pois a associação da marca a palavra “streaming” é tão forte como Band Aid é para curativos. No entanto, com a forte popularização que o streaming vem tendo, impulsionado sobretudo pela pandemia, possivelmente teremos novos efeitos parecidos, sejam eles por Apple, Amazon, HBO ou Disney.
Por mais que o efeito Netflix (ou outros efeitos parecidos) aconteça de forma orgânica, é possível planejar o crescimento/escala da sua empresa e poder contar com esses "atalhos" para impulsionar a venda de seus produtos de forma mais rápida. Dito isso, conheça o Curso Online de Growth, do G4 Educação, e tenha acesso a um manual prático para que você desenvolva o seu negócio com quem já construiu empresas bilionárias.