Das farmácias da Espanha para os supermercados de todo o mundo. Neste estudo de caso da Danone, vamos descobrir quais foram as avenidas de crescimento exploradas pela empresa franco-americana que a transformaram em uma das maiores multinacionais de laticínios do mundo.
Com a pandemia, muitas empresas de bens de consumo enfrentaram desafios, e para a Danone não foi diferente. Contudo, 2021 foi um ano de recuperação para a gigante global, que encerrou o ano com uma receita de US$ 28,727 bilhões, um aumento de 6,7% - o crescimento trimestral mais rápido em sete anos.
Presente em 140 países, está entre as quatro maiores empresas de laticínios do mundo e possui uma participação de mercado expressiva de 21%.
Com um portfólio amplo, é difícil não lembrar de algumas marcas da empresa presentes no Brasil, como Activia, Danoninho, Bonafont (que inclusive deixou de ser comercializada no Brasil recentemente) e Danette, só para citar algumas. Mas nem sempre foi assim.
A empresa percorreu um longo caminho até se tornar marca líder no segmento, saindo da produção de iogurtes em baixa escala em 1919, para uma companhia de mais de 90 mil colaboradores em 2022.
A Danone começou com o médico Isaac Carasso notando uma demanda por saúde e bem-estar no momento em que terminava a primeira Guerra Mundial. Com a alta taxa de desnutrição e problemas intestinais, a população na Europa se interessava cada vez mais pela saudabilidade.
Com isso em mente e inspirado por pesquisas que demonstravam os benefícios do iogurte para a saúde, em 1919, ele começou a produzir em pequena escala e transformou o insight em oportunidade de negócio - e as pessoas compraram.
Distribuído inicialmente em farmácias, a procura do público pelas propriedades saudáveis do iogurte contribuiu para popularizá-lo, e em pouco tempo as vendas cresceram, fazendo com que passasse a ser vendido em lojas convencionais, o que ampliou a base de clientes de maneira significativa.
Com o sucesso, o fundador, Isaac Carasso, decidiu expandir - direcionamento que acompanhou a Danone por toda a sua trajetória.
Antes de começar o processo de expansão, a Danone focou em reposicionar a marca, e ao longo de 10 anos, trabalhou para fortalecer a percepção para além de uma marca saudável - focando em se tornar uma empresa de laticínios, afinal, havia saído das farmácias e estava migrando tanto para lojas quanto para seus próprios pontos de venda.
Após o longo trabalho, o país escolhido para expandir foi a França e em 1929, a Danone se tornou internacional - e o iogurte passou a ser comercializado como uma sobremesa ideal para uma digestão mais saudável.
Em 1942, a Danone já havia construído uma boa reputação na Europa, com diversos pontos de venda na Espanha e na França, e já era hora de crescer novamente e dessa vez, em outro continente. No mesmo ano, começaram a fabricar iogurtes em Nova Iorque, com o nome “Dannon”, que soava mais amigável ao público americano.
Contudo, por hábitos alimentares diferentes e também conceitos culturais da época, o apelo saudável da marca não cativou os novos consumidores - o que demandou uma nova estratégia de marketing. Então, a Danone (Dannon), deixou de lado a abordagem que a fez popular na Europa para se adequar: passou de saudável e “recomendada por médicos” para ser uma marca saborosa.
Para endossar o posicionamento, lançou uma versão do iogurte com camadas de morango, o que a fez enfim, ganhar a atenção do público americano nas prateleiras do supermercado. Os sabores diversificados foram fundamentais para que a marca conseguisse uma boa penetração.
Em 1950, por exemplo, a Danone já produzia seis sabores diferentes e respondia por cerca de 75% da produção de iogurte nos Estados Unidos, vendendo em média US$3 milhões anualmente.
Apesar do sucesso, a liderança decidiu focar seus esforços novamente na Europa, e acabou vendendo a Dannon em 1959 para a Beatrice Food por US$ 3 milhões. Contudo, o negócio não pararia de crescer e a Danone compraria novamente nos anos 80.
Em 1967 a Danone deu um passo importante para se consolidar ainda mais como uma empresa de laticínios ao fundir-se com a Gervais, a principal empresa de queijos da França, líder de mercado no setor de iogurtes, queijos naturais e sobremesas, e passou a se chamar Gervais Danone.
A fusão fez com que a empresa conquistasse também a base de clientes leais da Gervais, que consequentemente compravam produtos Danone sem questionar. O queijo, inclusive, é um dos produtos que mais gera receita para a Danone até hoje.
Pouco tempo depois, em 1973, outra importante fusão aconteceu: a Danone fundiu-se com a fabricante de garrafas BSN, que possuía muita experiência e grande participação no mercado. Assim, nasceu um dos maiores conglomerados da época, pelo menos na Europa: a BSN-Gervais Danone.
Uma série de fusões e aquisições foram essenciais para que a Danone expandisse e a BSN teve um papel fundamental no processo, que começou da década de 70:
Enquanto isso, nos Estados Unidos, a Dannon já era conhecida e agradava o público. A essa altura comercializava 10 sabores diferentes e as vendas iam bem - 35 dos 100 milhões de iogurte comprados anualmente no país eram da Dannon.
Em 1981 vendia 1,3 bilhão de potes anualmente nos Estados Unidos e a empresa contava com mais de 60 mil funcionários, além de fábricas em diferentes estados.
Com todo esse sucesso, a BSN viu que era hora de recomprar o negócio e foi o que aconteceu.
Ao fim da década de 80, a BSN havia se tornado líder nos mercados de bebidas e vidros, e a Danone ganhou vantagem competitiva e penetração em outros mercados, como por exemplo, o asiático.
Os anos 80 e 90 marcaram a história da empresa de laticínios. A Danone focou em aumentar ainda mais a consciência da marca (principalmente nos Estados Unidos), com o objetivo de consolidar-se como top of mind. Assim, a ideia era fortalecer a imagem de iogurte saborosos.
Em 1985, a empresa investiu US$ 13 milhões em publicidade, começou a aparecer na TV e a realizar trade marketing. O esforço deu certo e a participação da Dannon foi de 21% em 1985 para 27% no ano seguinte.
Além do esforço em marketing e das importantes fusões e aquisições anos antes, foi nesse período que a companhia começou a olhar mais estrategicamente para o futuro, pensando em expandir o portfólio de produtos e também, intensificar o processo de internacionalização.
Com o objetivo de diversificar as fontes de receita, deixando de depender de um único produto, o conglomerado que já era líder no setor de bebidas e iogurte se voltou para o mercado de biscoitos, e em 1987, adquiriu a empresa global de biscoitos General Biscuit, que proporcionou um novo mundo de oportunidades.
A Danone ainda adquiriu outros grandes players desse segmento, a Peek Freans e Jacob’s e a Nabisco.
No início dos anos 90, a expansão internacional se intensificou e a empresa investiu em mercados da América do Sul, Ásia e África do Sul, fortalecendo ações de marketing da marca. Adquiriu também controle acionários de fabricantes de biscoito russas e tchecas, e formou ainda joint venture na Ásia a fim de comprar a operação da Nabisco.
A empreitada incluiu o maior fabricante de biscoitos da Índia, como também empresas que produziam e comercializavam biscoitos, salgadinhos, nozes e outros produtos em Singapura, Hong Kong e Malásia.
Em 1994, a empresa investiu 49% do faturamento para comprar a Campineira de Alimentos, segunda maior fabricante brasileira de biscoitos, e foi nesse ano que deixou o nome BSN e passou a ser conhecida como Grupo Danone.
A essa altura, com produtos fabricados em 30 países e exportados para o exterior, a empresa era uma potência global de alimentos e líder na Europa, com marcas globais de laticínios, biscoitos, bebidas e água.
Embora o iogurte ainda fosse o carro-chefe, com as aquisições, uma melhor distribuição de receita foi alcançada, que era um dos grandes objetivos da Danone até então.
Em 1995 a receita foi de US$17 bilhões, o dobro do número conquistado a 6 anos atrás, e muito do crescimento se deu pela estratégia global ambiciosa de US$5 bilhões em aquisições, feitas sistematicamente ao longo dos anos.
Perto dos anos 2000 a empresa mudou a estratégia e fez o caminho inverso do que havia sido feito praticamente desde sua fundação, sobretudo no que se refere a estratégias de M&A.
A Danone se desfez de muitas aquisições e passou a dar ênfase em laticínios, biscoitos e bebidas, e o crescimento mundial passou a priorizar esses segmentos.
Contudo, em 2007, outra grande mudança aconteceu: a empresa vendeu grande parte da divisão de biscoitos para a Kraft Foods (atual Mondelez) por €5,1 bilhões, e investiu em uma das divisões de negócios que ela viria a ser especialmente conhecida atualmente: nutrição e alimentos para bebês.
Então, no mesmo ano que deixou o mercado de biscoitos, a Danone comprou a empresa Numico por € 12,3 bilhões, se tornando o segundo maior produtor de alimentos para bebês do mundo, mas não só isso.
A mudança de rota incluiu também um posicionamento mais assertivo da empresa como uma companhia de saúde, bem-estar e sustentabilidade, e embora incluísse outra abordagem, parecia estar voltando às raízes, incluindo até um retorno às farmácias, através das fórmulas para bebês.
Desde então, a Danone investe significativamente na linha de nutrição infantil, incluindo parcerias com institutos de nutrição e fabricação para reforçar o fornecimento de fórmulas - em 2010 adquiriu a Unimilk, um grupo de empresas russas que detinham grandes marcas deste segmento, reforçando a nova estratégia da empresa no mercado de nutrição infantil.
Com a aquisição, a Rússia ficou próxima à França em termos de vendas, lembrando que os franceses são um dos maiores consumidores da Danone há mais de um século.
Seguindo a mesma estratégia da Rússia, a Danone entrou no mercado indiano e africano, adquirindo os maiores players em cada um.
A reorientação, também fortaleceu a importância que a empresa dá para o P&D, um de seus maiores diferenciais competitivos atualmente. A Danone abriu seu próprio centro de inovação em 2013, o Nutricia Research, que inclui 400 cientistas de 30 nacionalidades diferentes.
Além disso, ao entrar para o nicho de nutrição infantil, abriu diversos Danone Institutes em todo o mundo. Os institutos sem fins lucrativos focam em realizar pesquisas sobre saúde e nutrição, auxiliando as inovações da Danone conforme expandem em todo o mundo.
A partir das pesquisas é possível entender aspectos culturais importantes, além das melhores abordagens para criar novos produtos e insights sobre posicionamento - afinal, é possível comprovar os aspectos saudáveis de seus produtos cientificamente, o que endossa sua atuação no setor de saúde.
A seguir, separamos os principais insights da trajetória de mais de um século da Danone e o que podemos aprender com a empresa que começou na Espanha e ganhou o mundo, sendo comercializada em mais de 100 países:
Um dos fatores que fez com que a Danone rapidamente se popularizasse na Europa, foi a busca dos consumidores por um item saudável, que pudesse ajudá-los a passar pelo momento de forte desnutrição, e o fundador rapidamente encontrou o product-market fit.
Porém, quando chegou aos Estados Unidos, as necessidades e expectativas do público eram outras. Os americanos estavam acostumados a comer fast- food e a pauta de alimentação saudável não era exatamente importante. Então, a empresa de laticínios teve que se reinventar de acordo com a demanda.
Portanto, é importante lembrar que o produto deve se encaixar com o público, não o contrário. Ao mudar o posicionamento, incrementar os produtos e se comunicar apropriadamente com os desejos dos novos potenciais clientes, a Danone pôde ganhar espaço e se tornar uma das marcas mais conhecidas e consumidas no país.
Outra iniciativa recente que reforça a abordagem customer centric da marca, é a divisão de produtos lácteos a à base vegetal, uma demanda crescente no mercado.
Em resumo, o que funciona em determinado ambiente, não necessariamente funcionará em outro. Por isso, entender o contexto, a cultura e os hábitos do público antes de expandir é essencial para não perder tempo e dinheiro.
Desde o começo, a Danone utilizou estratégias de aquisição para expandir, conquistando não apenas novos mercados como conhecimento e experiência dos negócios aos quais se fundia.
Além disso, embora soubesse que o carro-chefe da companhia era o iogurte, se movimentou para que não dependesse somente de um único produto, e nesse sentido, as fusões e aquisições foram essenciais para expandir o portfólio da empresa e ajudar a equilibrar a receita.
Portanto, ao entender as particularidades do produto - o iogurte poderia ser rapidamente ameaçado por alguma doença nas vacas ou desastre natural, por exemplo -, a empresa se adiantou e tentou diminuir os riscos envolvidos na operação.
Sendo assim, além de crescer o negócio, penetrando em diversos mercados, adquirir empresas pode ser uma maneira estratégica de gerenciar melhor os riscos que envolvem seu próprio negócio, tornando-se mais competitivo.
O processo de expansão geralmente é empolgante para qualquer empresa. Depois de tanto esforço, chegar a novos mercados e desenvolver diversos produtos faz brilhar o olho de qualquer empreendedor, contudo, se não for estratégico, pode fazer com que a empresa perca o foco, produzindo uma série de produtos que não fazem sentido a médio e longo prazo.
A Danone fez uma série de fusões e aquisições ao longo de sua história, e em um certo momento do negócio, não havia mais muita sinergia com muitas aquisições. Esse é um ponto fundamental para um processo de M&A: em geral, deve incluir benefícios mútuos para as empresas envolvidas, e se não gera, deve ser repensado.
Portanto, pensar estrategicamente antes de qualquer aquisição ou fusão é essencial para manter a proposta de valor clara, respeitando os objetivos das companhias, posicionamento e desejos para o futuro.
Portanto, é essencial entender como aquela parceria se encaixa no plano do negócio a médio e longo prazo. Nesse sentido, é fundamental entender completamente o custo de determinadas oportunidades, principalmente em um processo tão longo e burocrático quanto à compra e venda de empresas.
No momento em que a Danone percebeu que deveria mudar os rumos e focar somente em algumas unidades de negócios, foi preciso deixar muitas aquisições para trás. Mesmo que um dia já tenham sido valiosas, na nova conjuntura, não seria benéfico.
Compreender e tomar decisões baseadas no momento do negócio e no que ele espera ser no futuro, pode ser o que determina o sucesso ou insucesso de qualquer empreendimento.
A Danone é uma empresa que existe há mais de um século. Permanecer crescendo ao longo desse período - lidando com diversos cenários econômicos, mudanças comportamentais, além de movimentos culturais, políticos e sociais sem dúvidas, inclui diversos desafios.
Para não apenas sobreviver mas continuar relevante em um mercado em constante mudança, mais que resiliência e adaptabilidade para não parar no tempo, foi preciso planejamento estratégico, iniciativas que impulsionaram a digitalização, e principalmente, foco no cliente.
A Danone entendeu que embora tivesse produtos de qualidade, deveria se mover em direção ao futuro atendendo e superando as expectativas do consumidor - utilizando a tecnologia a seu favor.
Em 2020, por exemplo, a empresa acelerou a transformação digital disponibilizando o site So Delicious, no qual os consumidores poderiam comprar os produtos diretamente, agindo rapidamente para não perder mercado durante o momento pandêmico.
O investimento em pesquisa e a atenção voltada a aspectos culturais e características comportamentais foram essenciais para mantê-la relevante mesmo depois de mais de 100 anos de atuação, e o avanço do digital potencializou essa abordagem.
Ao lançar um novo produto, a empresa esperava de 6 a 8 meses para saber se havia aderência do público ou não, mas a partir de um site online, passou a receber feedbacks em tempo real, além de resultados expressivamente rápidos, que melhoram o desenvolvimento de novos produtos e a eficiência - além de obter uma base de dados capaz de auxiliar lançamentos futuros.
A Danone já estava em diversos continentes, e através do uso de recursos tecnológicos atuais, foi capaz de melhorar a qualidade do gerenciamento global - aumentando a eficiência e diminuindo custos.
A multinacional entendeu desde muito cedo, a importância da inovação e de criar conexões com a persona através dos produtos e serviços oferecidos, e ao longo do tempo, foi capaz de refinar essas percepções.
Uma das principais mudanças recentes no comportamento do consumidor, é sua preocupação crescente com temas sustentáveis e seu desejo de se relacionar com marcas capazes de atuar alinhadas com essas perspectivas. Isso é ainda mais relevante no caso da Danone, dada a sua atuação global.
Agindo de acordo com seu tempo, a companhia pretende ser totalmente B Corp até 2025, o que a tornaria a primeira empresa internacional a atingir esse padrão de responsabilidade social e ambiental. Além disso, alinhou suas metas com os objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU, que devem ser cumpridos até 2030.
A Danone não inovou de maneira disruptiva, nem criou um método totalmente novo de vendas ou aquisição, contudo, tornou-se pioneira em embalar o iogurte e distribuí-lo comercialmente.
No caso da companhia de laticínios, a inovação se deu não apenas na criação do iogurte mas na capacidade de entregá-lo. A Danone tornou o iogurte acessível, prático e principalmente, logisticamente viável, afinal, ninguém consome um produto se ele não é bem distribuído.
Desde 1919, a empresa vem construindo uma participação significativa em alimentos, laticínios, água e, mais recentemente, fórmula para bebês, além de atender a uma série de demandas sustentáveis e digitais, mantendo-se popular entre os consumidores em diversos países.
Nos últimos 10 anos, a Activia vendeu mais de 3,5 bilhões de copos de iogurte somente no Canadá e no Brasil, a marca assumiu status de metonímia - iogurte é comumente chamado de danone.
Em março de 2022 a companhia compartilhou o plano “Renew Danone” baseado em quatro estratégias principais: restaurar a competitividade nas categorias de atuação principais, expandir de maneira seletiva, semear avenidas de crescimento futuras e rotacionar ativamente o portfólio, o que reforça que a multinacional está planejando mais séculos de atuação por vir, se mantendo não só relevante, mas também competitiva.
Afinal, não basta somente criar um negócio, é preciso crescer.
Se você deseja acelerar o crescimento do seu negócio, conheça o curso online G4 Growth do G4 Educação e aprenda como aplicar as estratégias de growth usadas por empresas como Facebook, Google, Amazon, Uber e Apple no seu negócio.