O mundo dos negócios está cheio de exemplos de estratégias boas, que ajudaram a transformar pequenas empresas em gigantes, e de estratégias ruins, que até hoje são lembradas como “o que não fazer” em uma companhia. É dessas estratégias boas e ruins que Richard P. Rumelt trata no livro “Estratégia Boa, Estratégia Ruim”.
Considerado um dos títulos mais importantes para quem quer entender o pensamento estratégico e como aplicá-lo em uma empresa, “Estratégia Boa, Estratégia Ruim” trata “do que é extremamente importante, não de tudo o que todo mundo faz ou quer fazer”.
“A essência de uma estratégia é um projeto de ações necessárias para enfrentar um desafio ou uma oportunidade importante. Seja no xadrez, na guerra, nos negócios ou na política, a ideia básica é concentrar a energia e os recursos onde eles serão mais úteis – no ponto fraco do inimigo ou do oponente ou onde a oportunidade de ganho é maior.”
Richard Rumelt traz uma série de cases e histórias para mostrar os efeitos da boa estratégia e as sérias consequências da estratégia ruim.
Estratégia não é definir metas ambiciosas, visões ou slogans. Dizer que a estratégia-chave da empresa é um aumento de 20% na receita e uma margem de lucro de 20% é um erro. Essas são metas.
Uma estratégia é um conjunto de ideias diferentes que inclui um plano para atingir essas metas. Ela inclui informações precisas sobre como as metas serão alcançadas. A confusão sobre o que é estratégia – que envolve meta, slogan e até chavão – acontece porque muitas vezes, uma meta ou uma visão pode ser o ponto de partida para desenhar uma estratégia.
Um banco chegou a dizer que sua estratégia era oferecer “intermediação centrada no cliente”. Por “intermediação”, entenda-se que o banco recebia depósitos e emprestava dinheiro a clientes. “Centrada no cliente” significa simplesmente que o banco se concentra em atender o cliente. Ao fazer essa análise, o que aparece é que a “estratégia fundamental” era ser apenas um banco.
Onde está o plano de ação? Sem plano de ação, não há estratégia.
Por mais que as estratégias possam ser diferentes, elas possuem um componente em comum: o núcleo. Esse núcleo é composto por três partes: um diagnóstico, uma política orientadora e um conjunto de ações coerentes.
O diagnóstico é uma análise simples de um conjunto de condições que podem ser complexas. A política de orientação estabelece as normas que serão usadas para lidar com o diagnóstico. Por fim, o conjunto de ações coerentes é que garante a aplicação eficaz da política de orientação. Em outras palavras, as ações necessárias para atingir as metas da política de orientação devem estar alinhadas para que as iniciativas sigam na mesma direção, em vez de ficarem o tempo todo se chocando entre si.
Um exemplo de diagnóstico e política de orientação pode ser encontrado na IBM, que vivia uma crise em 1993. A direção da empresa discutia se deveria se adaptar à fragmentação do mercado de computadores, mas o CEO Lou Gerstner veio com um diagnóstico diferente: integrar e centralizar os vários departamentos para que a IBM pudesse se tornar líder de mercado em consultoria de TI.
O diagnóstico foi colocado em prática com uma nova política de orientação que concentrava os recursos da IBM nas soluções para os clientes.
Pensando nas ações que devem ter uma coerência, o exemplo que o livro traz é da Ford Motor Company, que decidiu consolidar os processos de design e fabricação das marcas Volvo, Jaguar, Land Rover e Aston Martin. Acontece que essas marcas sempre foram valorizadas por suas qualidades exclusivas. A estratégia da Ford falhou ao pensar somente em sinergia e ignorar completamente as características das marcas e de seus clientes.
Toda estratégia implica uma escolha. Para atingir seu objetivo, a estratégia propõe uma direção a seguir. E raramente é possível andar em duas direções diferentes ao mesmo tempo e fazendo tudo certo.
Uma boa estratégia exige da empresa e de seus colaboradores a priorização daquilo que é mais importante, para que então os recursos possam ser alocados para fazer isso acontecer. Tentar correr cada um para um lado, não vai funcionar.
Não funcionou para a Digital Equipment Corporation (DEC), fabricante de computadores que enfrentava o dilema de competir com um novo tipo de PC. Como as lideranças não chegaram a um acordo, tentaram diferentes soluções, da criação de sistemas, soluções para clientes ou novas tecnologias de chip. Até chegar a uma decisão melhor, em 1993, a empresa não teve tempo de pivotar e acabou vendida para um concorrente.
Andy Grove, o lendário CEO da Intel, enfrentou um dilema parecido, mas decidiu por uma ação diferente. Ele mudou o foco da empresa para fabricação de microprocessadores. Mesmo enfrentando oposição dentro da Intel, ele seguiu firme e em 1992, a Intel era a maior fabricante global de semicondutores.
“Seja no tabuleiro de xadrez, no campo de batalha, em uma campanha política ou em uma empresa, as estratégias eficazes são projetos de ação coordenada que visam superar desafios específicos.”
Para lucrar com uma estratégia, a empresa precisa garantir que ela seja capaz de trazer vantagem sobre os concorrentes. Isso significa que a estratégia deve antecipar oportunidades, antes que a concorrência tenha tempo de agir.
Em termos de negócios, antecipar significa ter uma visão do presente que permita identificar as possibilidades emergentes – e agir de acordo com elas.
Um bom exemplo é a montadora japonesa Toyota, que investiu mais de US$ 1 bilhão em tecnologias híbridas de eletricidade e gasolina, muito antes do movimento de eletrificação ganhar corpo. A companhia entendeu que a diminuição de combustíveis fósseis levaria a uma demanda por carros elétricos e híbridos. Com isso, a Toyota foi pioneira na primeira tecnologia híbrida e levou vantagem sobre os concorrentes.
Richard Rumelt afirma que para antecipar uma oportunidade e ganhar vantagem competitiva, é fundamental identificar o ponto central de articulação do seu mercado.
A rede de lojas 7-Eleven percebeu que seus clientes no Japão ficavam rapidamente entediados diante da mesma seleção de refrigerantes. Aí veio o estalo: variedade. A estratégia que se seguiu foi um sistema para maximizar a variedade de refrigerantes, pesquisando as preferências locais. Ao fazer isso, a rede de lojas de conveniência se destacou das demais, que não tinham o que os consumidores japoneses buscavam.
Chegou o momento de se questionar: tenho os recursos para realizar minha estratégia? E ainda: esses recursos refletem minha situação atual?
Uma boa estratégia é composta de ações baseadas em sua situação atual e que se encaixam para maximizar sua vantagem.
De nada adianta ter uma estratégia que engloba várias ações, com impacto em toda a empresa, se não há gente suficiente para colocá-la de pé. Ou então não há colaboradores treinados para execução.
“Uma estratégia não é uma lista de aspirações ou ambições, nem é uma lista de todas as coisas que os membros do comitê acham que são boas ideias. A estratégia eficaz trata do que é extremamente importante, não de tudo o que todo mundo faz ou quer fazer.”
No mundo de hoje, a única constante é a mudança. Isso se aplica e muito aos negócios. Portanto, as empresas que conseguem desenvolver estratégias que se aproveitam das mudanças terão mais lucratividade.
Mesmo quando os efeitos das mudanças parecem óbvios e não configuram uma vantagem clara, é importante observar os chamados efeitos de segunda ordem, ou seja, aqueles efeitos derivados que são menos óbvios e abrem outras oportunidades.
Foi o que aconteceu com o surgimento da TV gratuita, que “roubou” público dos cinemas. Os grandes estúdios tiveram de compensar essa perda de receita assumindo o papel de financiamento em filmes independentes, que pudessem atrair uma audiência especializada. Quem ganhou com isso foram os diretores e roteiristas, que passaram a contar com mais recursos para produzir seus filmes – que chegaram a ganhar o Oscar, como foi o caso de “Um Estranho no Ninho”.
A inovação também é um gerador de mudanças. Basta olhar para vários mercados para perceber isso: a mudança dos filmes fotográficos em branco e preto para os coloridos (que colocaram a Kodak e a Fuji na ponta) e a troca das câmeras fotográficas analógicas pelas digitais mostram como a inovação tem o poder de chacoalhar mercados inteiros.
Uma estratégia transforma visões em realidade. Em muitos casos, faz isso ao maximizar a vantagem competitiva, ou seja, a capacidade de produzir mais valor a custos mais baixos do que os concorrentes.
Uma forma de fazer isso é ter uma estratégia que utiliza mecanismos de isolamento, que conferem uma vantagem competitiva em uma área ao limitar as oportunidades da concorrência.
A Apple dominou durante muito tempo o mercado de dispositivos móveis ao instalar em seus iPhones mecanismos de isolamento que funcionam em conjunto. Não é só a tecnologia, é a marca, o prestígio da companhia, os apps complementares e integrados. Demorou muito tempo para que a Samsung, com a estratégia de vários modelos, níveis e preços, ultrapassasse a Apple.
Richard Rumelt, autor de “Estratégia Boa, Estratégia Ruim”, afirma que para se tornar um bom estrategista, é preciso criar hipóteses estratégicas. Estamos falando de teses que são fundamentadas em uma ideia e que ao serem testadas, vão determinar se funcionam ou não. Se funcionarem, temos um negócio.
Para Howard Schultz, a hipótese a ser testada é que a experiência de se beber um café expresso na Itália poderia ser recriada nos Estados Unidos com sucesso. Ele convenceu uma empresa de torrefação em Seattle a ceder um espaço para montar um pequeno espaço para café expresso. O nome da companhia? Starbucks.
Schultz começou copiando o café expresso italiano, mas logo percebeu que os norte-americanos preferiam tomar sua bebida sentados e não apenas encostados no balcão. Ele introduziu mesas e cadeiras. Com a demanda para levar o café, em vez de consumir na loja, ele introduziu os copos de papel.
Em outras palavras, ele testou sua hipótese, aprendeu com ela e foi além de recriar a experiência italiana. Ele testou, refinou, testou, refinou novamente.
Howard Schultz adaptou o formato para a preferência americana, o que fez com que o Starbucks se transformasse em um game changer. Sua empresa comprou as lojas e a marca registrada da Starbucks em 1987. O resto é história.
Todo bom estrategista teme o momento em que, acreditando que está no topo do mundo, acaba tomando a decisão errada. Isso acontece, muitas vezes, quando se parte da visão interna na hora de olhar uma situação. Em resumo, olhar de dentro para fora e não de fora para dentro.
A visão interna é a tendência de ignorar as lições que outras pessoas aprenderam em uma situação semelhante. Achar que “não vai acontecer comigo” é um erro, pois ignora o aprendizado com o fracasso alheio.
Para evitar esse pensamento, é importante ganhar perspectiva, examinando atentamente uma situação de fora. Uma boa forma de fazer isso é se perguntar: Por que outras pessoas em uma situação semelhante à minha tiveram sucesso ou fracassaram?
A crise financeira de 2008 pegou empresas, investidores e analistas econômicos “de surpresa”, com efeitos devastadores. Isso aconteceu porque os analistas não aplicaram uma visão externa e falharam em enxergar os sinais que lembravam crises passadas.
A boa estratégia se beneficia de prestar atenção às experiências de outras pessoas e às lições que elas aprenderam com essas experiências.
Em “Estratégia Boa, Estratégia Ruim”, Richard Rumelt diz que todos podemos aprender a ser bons estrategistas. Para isso, é preciso entender o que faz uma boa estratégia, seja alavancando, maximizando recursos, antecipando mudanças ou buscando inovação.
O livro traz ainda alguns conselhos práticos para chegar lá: