Como o Google Funciona
Autor: Eric Schmidt e Jonathan Rosenberg
Quando se fala sobre as principais empresas de tecnologia das últimas décadas, é praticamente impossível que nome Google não seja mencionado. Dito isso, tratar de compreender como o Google funciona passa por analisar como a empresa se tornou líder global de mecanismos de pesquisa até sua expansão a outros elementos tecnológicos como email, dispositivos móveis e redes sociais.
Apesar da exponencial crescente desde sua fundação em 1998 – se tornando apenas a quarta empresa estadunidense na história a alcançar um valuation de US$ 1 trilhão quando o fez em janeiro de 2020 – o Google nunca deixou de lado sua mentalidade de startup.
Dito isso, na obra “Como o Google Funciona”, os autores Eric Schmidt e Jonathan Rosenberg detalham a como liderança do Google, partindo dos fundadores Larry Page e Sergey Brin, conseguiu criar uma cultura organizacional que, até os dias de hoje, atrai aos melhores profissionais, sobretudo os mais focados em tecnologia, que trabalham incansavelmente para desenvolver produtos inovadores ano após ano.
Além disso, você aprenderá sobre o foco do Google na contratação de funcionários que combinam conhecimento técnico com uma personalidade curiosa e ambiciosa. Gerenciar esses profissionais obstinados não é fácil, mas os resultados –como prova o sucesso do Google– valem a pena.
Como curiosidade, Schmidt foi CEO da empresa entre 2001 e 2011 e Rosenberg atuou como vice-presidente executivo de product management do Google entre 2002 e 2011.
Nas últimas décadas, os avanços tecnológicos mudaram totalmente nossas vidas e o mundo como o conhecíamos. Hoje, podemos armazenar quantidades ilimitadas de informações online e conectar-nos facilmente à internet por meio de praticamente qualquer dispositivo móvel.
Dentro dos negócios, essas inovações mudaram a atenção de todos para o desenvolvimento de produtos, e isso aconteceu de duas maneiras.
Em primeiro lugar, a internet levou os consumidores a exigirem produtos melhores, dando-lhes mais informações e mais opções. Caso clientes não gostem do seu aplicativo, por exemplo, eles podem simplesmente baixar outro.
Nesse novo mercado consumidor, ter o melhor produto possível, além de oferecer um customer experience diferenciado, é algo imprescindível quando se trata de conquistar e sobretudo fidelizar clientes.
Em segundo lugar, os avanços tecnológicos mudaram o mundo dos negócios, permitindo que as empresas desenvolvam produtos de forma rápida e por um custo menor. Mesmo uma pequena equipe de engenheiros, por exemplo, pode desenvolver um novo produto em poucos meses e depois lançá-lo online e gratuitamente para milhões de pessoas.
Por conta disso, é muito mais comum ver bons produtos superando estratégias de marketing mais sofisticadas. No caso do Google, esse insight crucial tem sido o princípio orientador da empresa desde o início. Larry Page e Sergey Brin se concentraram exclusivamente em desenvolver o melhor mecanismo de pesquisa possível, confiantes de que, se tivessem sucesso, obteriam retorno financeiro.
Hoje, dentro os principais mecanismos de pesquisa, o Google tem 92% do market share global, segundo a StatCounter.
O algoritmo do mecanismo de pesquisa do Google é um exemplo do tipo de produto revolucionário que só pode ser criado por funcionários qualificados, chamados de smart creative (em português, inteligentes criativos).
Os inteligentes criativos combinam conhecimento convencional e técnico sobre negócios com sensibilidade criativa. Eles são competitivos, ambiciosos e curiosos –o tipo de pessoa que passa a noite inteira tentando resolver um problema complexo ou, em alguns caso, até ignora ordens diretas apenas para provar um ponto.
Os inteligentes criativos são a própria essência da empresa e como o Google funciona. De fato, tanto Larry Page como Sergey Brin são claros exemplos desse tipo de trabalhador.
Dito isso, ao conhecerem bem sua própria “espécie”, eles adotaram uma abordagem de contratação simples: trazer os melhores engenheiros e dar-lhes o máximo de liberdade possível para desenvolver os produtos que mais se destacassem.
Assim como mencionado, inteligentes criativos são a chave para o desenvolvimento de ótimos produtos. Neste caso, como sua empresa pode atrair funcionários que se enquadrem nessa descrição e, especialmente, como reter esses talentos?
Para começar, faça da contratação uma de suas principais prioridades. Na maioria das organizações, a contratação de novos funcionários cabe ao gerente supervisor, porém as opiniões de apenas uma pessoa são altamente subjetivas.
Em vez disso, concentre-se na criação de um comitê de contratação para representar os diferentes pontos de vista e funções da sua empresa (por exemplo: um engenheiro, um vendedor e um gerente).
É exatamente assim que as contratações acontecem no Google. Os comitês analisam os candidatos com base em dados concretos e materiais de apoio, como relatórios de entrevistas, histórico de remuneração, currículo e referências.
Embora todos esses documentos de apoio sejam valiosos, a contratação de inteligentes criativos também requer imaginação. Olhar para um currículo e avaliar um candidato com base na experiência não é a forma como você encontra os funcionários mais interessantes, inteligentes e adaptáveis.
Além de fazer perguntas padrão de entrevista, pergunte aos candidatos sobre seus interesses e paixões e desafie-os com perguntas inesperadas como, por exemplo, como eles pagaram por seus estudos universitários.
Nesse sentido, Eric Schmidt, autor do livro e ex-CEO do Google, faz a si mesmo uma pergunta antes de tomar qualquer decisão de contratação: se ele ficasse preso em um aeroporto com o possível funcionário, eles conseguiriam manter uma conversa interessante?
Logo, feita a contratação do inteligente criativo, o que você pode fazer para mantê-lo em sua empresa?
Essa questão é importante, pois esse tipo de profissionais são inquietos e ambiciosos por natureza e, em algum momento, e podem querer deixar sua empresa e tentar algo novo.
Para evitar que isso aconteça muito cedo, encontre maneiras de desafiá-lo e envolver seu intelecto. Dessa forma, eles se sentirão estimulados e motivados, podendo assim conter sua vontade de sair.
Por exemplo, quando um grande engenheiro queria deixar o Google, Schmidt o convenceu a ficar convidando-o para participar de reuniões importantes com os fundadores. Participar dessas reuniões permitiu ao engenheiro aprender coisas novas sobre o negócio e, como resultado, ele acabou ficando no Google por mais dois anos.
O que você pode fazer para tornar sua empresa mais atraente para inteligentes criativos? A resposta está na cultura de sua empresa –ou seja, os valores sobre os quais sua empresa foi construída. Neste caso, esses funcionários prosperam em ambientes que estimulam a criatividade, sendo estes os três principais aspectos de uma cultura empresarial criativa:
O terceiro ponto é crucial: você deve encontrar uma maneira de dar aos seus funcionários a liberdade de tomar suas próprias decisões –algo muito comum em organizações que adotam o que hoje é conhecido como gestão libertária. Se você não puder fazer isso, pelo menos certifique-se de ter um bom motivo ao dizer “não”.
Definir seus valores é outro aspecto importante da criação de uma cultura empresarial atraente. Por exemplo, em 2004, os fundadores do Google criaram um documento delineando os princípios orientadores da empresa. Essas frases incluíam “Não seja uma pessoa ruim” e “Faça do mundo um lugar melhor”.
Dito isso, seguir essas etapas apenas ajudará você a criar um ambiente para atrair os melhores talentos, porém não disciplinará ou motivará os funcionários e não transformará colaboradores regulares em inteligentes criativos.
O que esses passos farão é trazer o tipo de pessoa que é atraída por uma determinada cultura da empresa, ao invés daquele tipo que só é seduzido por grandes salários; encontrar pessoas que estão motivadas para trabalhar duro, independente de quanto são pagos, certamente ajudará sua empresa a ter sucesso.
Por exemplo, em 2002, o fundador Larry Page viu alguns anúncios dos quais não gostou em uma página de pesquisa do Google. Ele imprimiu a página da web e postou em um quadro de avisos na cozinha da empresa com a legenda “ESTES ANÚNCIOS SÃO HORRÍVEIS”.
Logo, uma equipe de engenheiros –que não era oficialmente responsável pelos anúncios– viu a nota de Page em uma sexta-feira, se inspiraram no problema e trabalharam nele durante seu tempo livre no final de semana. Na segunda-feira seguinte, eles encontraram uma solução.
Em suma, não é que o próprio Google inspire esse nível de devoção, mas sim a cultura da empresa que atrai pessoas intrinsecamente motivadas e trabalhadores dedicados.
A maioria dos CEOs pode pensar que sua empresa precisa de um plano de negócios, mas, na verdade, a maioria dos planos tradicionais leva inevitavelmente ao fracasso.
O motivo: um plano típico não deixa muitos espaços para mudanças.
No entanto, administrar uma empresa exige que você responda a novos desafios sempre que eles surgirem.
Para exemplificar, digamos que você definiu uma estratégia de longo prazo para seu negócio de tecnologia.
Por conta disso, em termos táticos, você estará melhor preparado para o inesperado se criar uma base estratégica ao invés de um plano estático.
A diferença: um plano é um guia contendo o passo a passo para administrar seu negócio. Uma fundação é uma apresentação de princípios orientadores.
Por exemplo, quando Jonathan Rosenberg escreveu a base estratégica para o Google em 2002, ele, inicialmente, planejou entregar um plano de negócios típico de um MBA, destacando alavancagem, distribuição, técnicas de marketing e assim por diante.
Em vez disso, terminou escrevendo algo mais amplo, pois percebeu o que realmente ajudaria a orientar seus funcionários. Sua base tinha três pontos de sucesso:
Estabelecer essa base permitiu que os inteligentes criativos do Google aplicassem suas habilidades e talentos especiais para criar soluções inovadoras para problemas inesperados.
Em empresas tradicionais, a tomada de decisão tende a ser hierárquica onde a alta administração toma as decisões importantes enquanto todos os demais acenam com a cabeça em concordância.
No entanto, se você tiver sorte o suficiente para gerenciar uma empresa composta por inteligentes criativos, as coisas funcionam de forma diferente. O processo de tomada de decisão torna-se tão importante quanto a própria decisão, porque se os funcionários não apoiarem a decisão, eles simplesmente não a seguirão.
Por exemplo, o fundador Sergey Brin certa vez discordou sobre um ponto com um engenheiro, mas, ao invés de forçar seu subordinado a concordar com sua decisão, ele propôs um meio-termo: metade da equipe o seguiria e a outra metade seguiria o engenheiro. Mesmo assim, essa decisão ainda não era conveniente para o engenheiro.
No final, toda a equipe acabou seguindo a solução do engenheiro e não a do fundador da empresa.
Logo, se você deseja promover esse tipo de tomada de decisão em seu próprio local de trabalho, crie uma maneira para que cada opinião e cada posicionamento sejam consideradas e discutidas. Como gestor, cabe a você impor uma discussão, não uma decisão.
Em outro momento da empresa, Eric Schmidt, Larry Page e Sergey Brin discordaram sobre um novo recurso do produto. No final, nem Page nem Brin saíram com solução ganhadora, mas, ao discutir suas opções, encontraram outra solução ainda melhor.
Como podemos notar, boas decisões requerem consenso, mas quando todos que debatem possuem opções diferentes, chegar à decisão mais correta pode levar uma eternidade. Contudo, vale ressaltar a importância do tempo e o quão importante é otimizar esse ativo, especialmente nos dias atuais onde o tempo é tido muitas vezes como escasso.
Decisões importantes podem e devem ser discutidas longamente, mas ainda é fundamental usar prazos para que as decisões não cheguem tão tarde a ponto de serem inúteis para a empresa.
Quando o Google estava considerando um acordo com a AOL em 2002, Schmidt reconheceu a gravidade de tal decisão e convocou reuniões diárias sobre o assunto por seis semanas. Dessa forma, sua equipe teve tempo suficiente para discutir e debater várias opções, garantindo que a decisão mais coerente e assertiva seria tomada, e dentro do prazo adequado.
Ao gerenciar profissionais criativos, você precisa ter uma abordagem aberta às informações para promover um ambiente de trabalho mais criativo e colaborativo.
No caso do Google, os relatórios trimestrais da empresa não são apresentados apenas ao conselho de administração, mas também a todos os funcionários para que os mesmos o possam a analisar.
Além disso, a intranet da empresa, chamada Moma, armazena informações sobre cada produto em desenvolvimento e abriga os objetivos individuais de cada funcionário e relatórios de status semanais. Dessa forma, todos sabem o que os outros estão fazendo, tornando muito mais fácil a colaboração e compartilhamento de conhecimento entre funcionários, mesmo entre departamentos diferentes.
Contudo, a abertura não é apenas um atributo positivo a ser cultivado a nível organizacional. É importante incentivar os funcionários a serem abertos e deixar claro que qualquer discussão será bem-vinda. Embora a maioria das empresas tenda a ser estritamente hierárquica, os inteligentes criativos funcionam melhor quando têm a oportunidade de falar o que pensam.
Os fundadores do Google alimentam essa tendência em seus funcionários organizando reuniões semanais com toda a empresa:
Como consequência dessas políticas, os membros da equipe do Google agora se sentem confortáveis para iniciar suas próprias conversas com colegas. Um funcionário, por exemplo, escreveu um “manual do usuário” sobre si mesmo, com conselhos sobre como trabalhar com ele de forma mais eficaz.
Outra funcionária definiu um “office hours” próprio, criando tempo para qualquer pessoa que quisesse fazer perguntas a ela.
"Pessoas inovadoras não precisam ser instruídas sobre como fazê-lo, elas precisam ser autorizadas a fazê-lo."
Por mais que a principal razão por trás da contratação de inteligentes criativos seja promover inovação dentro da empresa, será que é possível “forçar” que esses profissionais sejam inovadores?
De acordo com o livro, muitas empresas tentam impor a inovação de forma artificial, por exemplo, nomeando um “Diretor de Inovação”, mas essa abordagem é raramente eficaz.
Dito isso, como ser uma empresa que cria produtos inovadores e surpreendentes? Embora você não possa fazer que seus funcionários sejam mais inovadores, você ainda pode seguir algumas dicas simples para criar um clima que estimule a inovação.
Em primeiro lugar, estabeleça metas elevadas que desafiem seus funcionários. Como regra geral, experimente multiplicar por dez cada meta que você definiu inicialmente. Por exemplo: relógios Quartz são 10 vezes mais preciso do que os relógios mecânicos mais precisos, e custam 1/10 disso.
Outra forma de incentivar a inovação é estar aberto ao risco e ao fracasso. No Google, por exemplo, 70% do orçamento da empresa vai para projetos básicos, 20% para empreendimentos em desenvolvimento e os 10% finais para novos experimentos. Dessa forma, mesmo os projetos que parecem arriscados ainda recebem financiamento, o que mantém a inovação em movimento.
Por último, se você realmente deseja ter uma empresa inovadora, permita que seus funcionários sejam inteligentes e criativos. É por isso que o Google permite que cada engenheiro gaste 20% de seu tempo laboral trabalhando em projetos de interesse próprio.
Como curiosidade, um dos produtos de maior sucesso da empresa, o Gmail, foi o resultado de 20% do tempo de um funcionário. Hoje, o Gmail é a maior plataforma de e-mails do mundo controlando 36,5% do market share.
Para desenvolver uma cultura de inovação como a que o Google tem em sua empresa, priorize a contratação e retenção de “inteligentes criativos” ou funcionários talentosos que se motivem pela missão e cultura da empresa e não só pelo salário que receberão.
Aqui, você pode ter que abrir mão de algum “poder” ou ajustar seu estilo de liderança, mas, assim como visto, os resultados valerão a pena.
Além disso, fomente a criatividade de seus funcionários seja deixando-os palpitar em projetos em desenvolvimento, incentivando-os a expressarem suas opiniões de forma fundamentada, mesmo que se oponham a de seus superiores, e/ou permitindo-lhes tempo para trabalhar em projetos de seu interesse.
No casa de contratações, use comitês para avaliar os candidatos a empregos. Convide representantes de todos os departamentos da empresa para participar, avaliar e discutir cada candidato. Isso irá garantir que quem você contratar terá naturalmente o apoio de toda a empresa.
Peça aos tomadores de decisão que usem a imaginação para avaliar se os funcionários em potencial são inteligentes, curiosos e criativos, certificando-se de que cada entrevistador façam cada candidato responder algumas perguntas inesperadas sobre seus interesses e paixões.