Rock in Rio esbanja longevidade com uma receita que mantém sua base ativa e engajada e expande a comunicação através de parcerias estratégicas.
Depois de tocar na primeira edição do Rock in Rio, em 1985, James Taylor compôs “Only a Dream in Rio”. "Eu estava lá e meu coração voltou a bater forte", diz a letra. A mística em torno de um dos maiores festivais de música do mundo não é à toa.
Ao todo, o RIR soma:
Mesmo com os números absurdos, não foram poucas as vezes em que o publicitário Roberto Medina, o idealizador do conceito RIR, pensou em desistir de sua obra. Já ouviu do próprio pai que depois de Frank Sinatra, Barry White e Julio Iglesias era sonhar alto demais. A panela de pressão vai ficando mais quente.
Em 1984, meses antes da concretização do que foi o marco da indústria internacional da música na América do Sul, foi apenas o entusiasmo de alguns garotos que Medina esbarrou em um Passat branco que o convenceram a bancar de fato o projeto. Era para ser cancelado - a reunião estava marcada.
Trinta e oito anos depois, com sua 22ª edição em curso, a nona no Brasil, o Rock in Rio é um indiscutível sucesso. 670 artistas nacionais e internacionais se revezam nesse momento, em 250 shows, para um público estimado de 700 mil pessoas.
Há muito, o Rock in Rio deixou de ser apenas um festival de música. Deu origem a mais de 50 produtos. Foi exportado para outros países. E ganhou ares de parque de diversão.
Contabilizando a 22ª edição, oito foram realizadas no Rio (1985, 1991, 2001, 2011, 2013, 2015, 2017 e 2019) e 13 no exterior. Lisboa sediou nove edições (2004, 2006, 2008, 2010, 2012, 2014, 2016, 2018 e 2022); Madri, três (2008, 2010 e 2012) e Las Vegas, uma (2015). Ao longo de 123 dias, 2,4 mil artistas se revezaram para um público de 10,4 milhões de pessoas.
Mas afinal, quais são os ingredientes de sucesso da gestão de marketing de um dos mais longevos festivais de música do mundo?
Uma marca que trabalha perfeitamente sua estratégia de marketing através da antecipação de expectativa, de uma surra de novidades, da conversa perfeitamente sincronizada com seu público-alvo e com parcerias estratégicas para aumentar o alcance de sua comunicação. Mentalidade de Growth Hacking.
Para além, uma marca que entregou ao longo de sua história momentos emblemáticos, daqueles que marcam gerações.
Momentos que entram no intangível da memória afetiva, que fidelizam fãs em uma recorrência de toda a vida, enquanto continuarem investindo em uma experiência do cliente atrativa e que desperte o que sempre foi característico do Rock in Rio: a ideia de uma Cidade do Rock, de uma catedral da música.
A história do Rock in Rio começa na Cidade Maravilhosa, que com a chegada do festival também ganharia a alcunha de Cidade do Rock. O ano era 1985 e o lugar escolhido para a realização do evento foi Jacarepaguá.
O RIR já nasce grande, com pretensões de fazer algo sem precedentes. Suas estratégias de crescimento empresarial fazem jus a uma história majestosa, tal qual a do rock’n roll.
À época, construiu então o maior espaço de festival do mundo: 5 mil metros quadrados de área, além de dois shopping centers com 50 lojas, dois centros de atendimento médico e uma grande infraestrutura para atender a quase 1,5 milhão de pessoas.
É um festival que entorta varal porque marca o começo das turnês das grandes bandas para os países latino-americanos. Muda como a indústria passa a distribuir seus shows. As maiores bandas do mundo começam a compreender uma oportunidade colossal de mercado na América do Sul.
Mais do que lotar estádios, viram por aqui um público ensandecido e apaixonado. A performance de “Love of my Life”, do Queen, é uma daquelas performances memoráveis da história do rock.
O sucesso da edição de 1985 rendeu uma segunda em 1991, desta vez no Maracanã - a Cidade do Rock, construída em 1985, foi demolida por decreto estadual.
Pulamos 10 anos e chegamos à terceira edição do festival. Os organizadores decidiram construir uma nova Cidade do Rock, no mesmo local onde ocorrera a primeira, com a inédita capacidade de 250 mil espectadores circulando no evento por dia, além de palcos alternativos ao principal.
É aí que o Rock in Rio começa a entregar uma oferta para além do seu conceito original. Mantém o peso de seus headliners na estrutura principal, mas entrega também palcos de música eletrônica, música nacional, música africana e pop music.
O RIR atravessa as fronteiras do Rio de Janeiro em 2004, com a primeira edição do Rock in Rio Lisboa, em Portugal. A organização do festival foi similar à edição de 2001, com uma Cidade do Rock construída totalmente focada para ecoar muita música entre seus palcos alternativos e principais.
385 mil espectadores e mais de 70 artistas ao longo dos 5 dias de festival, registrando um sucesso absoluto em seu primeiro plano de ação de expansão internacional. Não demorou muito para uma segunda edição, e uma nova posição estratégica no Velho Continente, em Arganda del Rey, Madrid, Espanha.
Em 2011, 10 anos depois da terceira edição realizada no Brasil, o evento voltou ao Rio de Janeiro. À época, a prefeitura acabara de construir o Parque Olímpico, em decorrência das Olimpíadas que seriam sediadas na cidade. A estrutura permitiu adequar a Cidade do Rock ao espaço com maior facilidade, o que garantiu uma maior periodicidade do evento.
Tivemos edições em 2011, 2013, 2017, 2019 e, agora, em 2022.
Em 2015, o Rock in Rio ainda realizou uma edição nos Estados Unidos. Foram feitos quatro dias de festival e cerca de 170 mil pessoas compareceram ao evento, que ocorreu na cidade de Las Vegas.
“É mais fácil para mim ter as pessoas comentando do festival do que eu falar sobre ele.”
A fala da Diretora de Marketing do Rock in Rio, Ana Deccache, mostra bem os caminhos pelos quais a estratégia de marketing do festival se desenha. Marcas precisam estar entre as conversas.
Quanto mais uma ação for assunto, melhor. Essa é a base do Buzz Marketing, estratégia que garante que marcas ganhem notoriedade entre seu público de maneira planejada. Mais do que ser assunto, empresas querem projetar como essa conversa entre consumidores será construída e desenvolvida.
“Buzz” é justamente isso: burburinho, comentários, animação em torno de um assunto e agitação. Não se trata do “falem mal ou falem bem, mas falem de mim”. Na verdade, marcas querem que consumidores conversem sobre algo que elas fizeram - ou estão fazendo, no caso do Rock in Rio.
Através dessa abordagem, o RIR atua com 4 pilares estratégicos:
As datas dos shows e atrações são divulgadas muito antes dos ingressos estarem disponíveis, o que gera ansiedade no público.
A antecipação por algo positivo ativa no cérebro partes ligadas à felicidade antes mesmo que a ocasião em si aconteça. É a famosa chamada “ansiedade boa”, ou “borboletas no estômago”. A antecipação produz toda a experiência imagética que você terá em alguma circunstância.
De acordo com o artigo científico “Anxiety, depression, and the anticipation of future positive and negative experiences”, quando não há questões de saúde mental ou emocional envolvidas, o seu cérebro está programado para antecipar experiências e projetar uma ideia positiva de como será viver aquilo independente de qualquer natureza.
Outra teoria que respalda a ideia de antecipação é o efeito Zeigárnik, nomeado após um experimento da psicóloga lituana Bluma Zeigárnik.
Em seus testes, a psicóloga entrevistou duas amostras de participantes. Solicitou, para cada grupo de análise, uma lista de tarefas e, que ao término, se lembrassem de certos detalhes dessas tarefas. No meio da atividade, algumas dessas pessoas foram interrompidas durante as atividades antes de finalizá-las.
O resultado do experimento revelou que esses participantes que foram interrompidos se lembraram 90% de mais detalhes do que aqueles que fizeram as tarefas sem interrupções.
Ao que se relaciona com antecipação, o estudo simplesmente demonstrou que algo em aberto possibilita reter melhor uma memória e, consequentemente, ela fica mais nítida na mente das pessoas até haver um desfecho.
Um exemplo disso é uma série que termina uma temporada e deixa em aberto uma continuação, as tais “pontas soltas”, que deixam qualquer um maluco por antecipação.
Ao trabalhar com antecipação, o Rock in Rio tem um período de lançamento do festival que é quase perene, do fechamento de uma edição, ao lançamento da próxima. Gera ansiedade, gera buzz, gera burburinho, gera conversa, gera movimentação.
Após divulgar a programação inicial do evento, várias outras novidades são divulgadas até as datas oficiais do show, como o anúncio de novos cantores ou vendas antecipadas - o que mantém o assunto “Rock in Rio” em alta durante todo o período de lançamento.
Tal qual o sentimento de antecipação, o que a comunidade científica diz é que quando somos expostos a algo novo, há um aumento na liberação de dopamina – neurotransmissor responsável pela sensação de prazer.
Em outras palavras, a novidade é um estímulo que ativa o sistema de recompensas do cérebro. Resultado da expectativa inconsciente de encontrar algo ainda mais benéfico. Se não bastasse você ter a consciência do que vai encontrar no Rock in Rio, você vai sendo munido de novidades até o evento que apenas estimulam a expectativa.
O Rock in Rio sabe como criar engajamento por antecipação e ao longo da jornada com uma série de novidades. É customer experience de ponta a ponta.
O Rock in Rio incentiva seu público a produzir conteúdos nas redes sociais sobre sua ida ao evento, o que gera cada vez mais desejo na rede de amigos de quem vai ao festival.
Redes sociais são sobre conversas, não sobre posicionamentos institucionais. Saber conversar, e mais, saber fazer com que o seu público converse com você e gere esse ambiente de troca, talvez seja uma das estratégias de buzz marketing mais interessantes que o Rock in Rio consegue executar.
Muita gente engaja com as hashtags escolhidas pelo evento e fazem questão de participar da comunidade Rock in Rio, mostrando a experiência que estão vivendo. O festival se tornou uma espécie de “Disneylândia do Rock”, onde tudo é possível e dias de magia acontecem.
Acompanhar as pessoas que estão vivendo isso se tornou quase que um imperativo social. Se tornou um termômetro do evento, para além do que sai na mídia, em um acompanhamento real time, das pessoas que estão vivendo sob diferentes perspectivas.
Isso só amplia a comunicação orgânica do Rock in Rio, ponto esse que ainda é trabalhado através das parcerias.
As marcas que patrocinam o evento recebem um calendário da comunicação para que elas possam também ativar seu público-alvo alinhada aos assuntos do Rock in Rio - o que é uma oportunidade do festival ter comunicação em outras narrativas e momentos.
O Rock in Rio trabalha como um verdadeiro parceiro das marcas. Faz questão de participar da jornada de cada parceiro, de modo que amplie seu alcance de comunicação. É uma estratégia quase que COHORT orgânica, em cascata para cada marca que faz uma ativação ou menciona Rock in Rio.
Com isso, ganha, para além de seus canais oficiais, momentos e circunstâncias específicas, sob as lentes de cada parceiro. Amplia a diversidade de vozes com a qual o festival é narrado, o que está intimamente ligado ao conceito do RIR, e consegue gerar um buzz marketing através da mídia e de parceiros estratégicos de uma forma muito interessante.
Além, é um grande parceiro dos músicos. O Rock in Rio é um festival conhecido por não economizar em cachês e em infraestrutura para receber seus grandes astros. Quem vem tocar no evento, nunca se sente desamparado. O buzz gerado também pelos artistas é um grande aliado para a estratégia de divulgação da marca RIR.
O Rock in Rio é um evento que beira o monolítico. Nas estatísticas iniciais, retiradas do site oficial, já passaram pelos palcos do evento mais de 10 milhões de pessoas. Mas as lições que o Rock in Rio ensina não são excludentes ao tamanho.
São inclusivas à ideia de conceito, inovação e experiência do usuário, pilares esses que qualquer empresa, independente do porte, podem aprender e começar a aplicar em seus negócios. Afinal, o que podemos aprender com o case Rock in Rio?
A grande sacada sobre comunicação é construir uma comunidade. É construir um hub e uma plataforma de conteúdo que pulse e que as pessoas falem e discutam sobre você. O Rock in Rio faz isso com maestria, ao criar um ambiente com o qual a grande parte do conteúdo gerado vem do seu público, mais do que sua comunicação institucional.
A comunicação institucional funciona mais como boletim informativo. O conteúdo, o sentimento do festival, o que está rolando, é por parte de sua grande comunidade que alimenta e mostra ao próprio público o termômetro do que está acontecendo ao longo dos dias de evento.
O RIR possui um público fiel, quase que indiretamente. Não necessariamente advoga pela marca, mas mostra com verdade a experiência que o conceito do festival entrega. É uma comunicação human to human, não de marcas para o consumidor.
Você cria desejo pelas redes emaranhadas de amigos que vão mostrando sutilmente o que é a experiência Rock in Rio: mais que um show, um festival que contempla um estilo de vida, pelo qual as pessoas dialogam e trocam organicamente.
Em contrapartida ao hype gerado pelo Rock in Rio 2022, a triunfal volta do festival pós-pandemia COVID-19, foi lançado o documentário que conta a história da edição de 1999 do Woodstock. Um caos de conceito.
Basicamente, tentaram reproduzir o sentimento “paz e amor”, de 1969, trinta anos depois, em uma base militar, com cortes bruscos de orçamento em infraestrutura e com uma line-up ancorada no hardcore.
A negligência com a experiência do consumidor, permissiva à preços abusivos pela competição aberta de terceirizados que capitalizaram a oportunidade do evento, somado a um serviço sanitário precário, geraram revolta e tumulto ao evento mais emblemático da música.
Fugiu ao seu conceito. Quis replicar algo de 1969 em 1999, com um público diferente, sob circunstâncias diferentes. O Rock in Rio mantém-se vivo desde 1985, com uma edição mais bem-sucedida que a outra. Consegue expandir suas fronteiras, mas nunca perde a essência do seu conceito: a Cidade do Rock, por onde quer que passe.
Essa ideia de Cidade do Rock expande cada vez mais para uma terra dos sonhos, com metaverso, parque de diversões e feiras de videogames. É um ambiente completo e sensorial.
A partir da quarta edição, o Rock in Rio ganhou também um parque de diversões, com direito a roda-gigante, de 28 metros de altura, montanha-russa, e tirolesa. Essa, de 200 metros de extensão, que fez sucesso até entre os artistas: Jared Leto, do Thirty Second to Mars; Ney Matogrosso, e will.i.am, do Black Eyed Peas, provaram e aprovaram.
Essa ideia de terra dos sonhos, da “Disneylândia do Rock”. A experiência do cliente, ou Customer Experience, é o termo utilizado para definir a cultura organizacional e estratégica que coloca o cliente no centro de todas ações e estratégias dentro de um negócio.
CX é o conjunto de percepções estrategicamente colocadas em prática para otimizar, facilitar e melhorar todas as interações entre cliente e marca. Essas interações incluem todo o processo de relacionamento antes, durante e após o relacionamento.
Se você quer vender um 4x4, leve seu cliente até uma estrada de terra. Se você quer vender um festival de música, crie o maior ambiente de harmonia, com as maiores bandas do momento.
A experiência do Rock in Rio gera desejo, seja pela parte da comunicação que cria uma comunidade, ou seja pelo conceito que garante a longevidade de um dos maiores festivais de músicas do mundo.
Para montar o line-up do festival, Roberto Medina consulta desde pesquisas de mercado até redes sociais. Ninguém chega a lugar nenhum sozinho: parcerias estratégicas ampliam o campo de visão, desde com marcas patrocinadoras, até com os artistas.
Para tocar na primeira edição, foram convidados 114 artistas. Hoje, na 22ª edição, já são contabilizados mais de 2.400 músicos. A estratégia de marketing de influência imbuída ao Rock in Rio potencializa a voz da marca.
Tal qual a já mencionada amplificação de comunicação através das parcerias estratégicas com marcas, que possuem suas próprias narrativas, em seus próprios contextos. Isso gera um hub de conteúdo rico, com o qual o material gerado sobre o Rock in Rio é diverso.
Existem diversas perspectivas, que ampliam o poder de identificação com o festival. Você se sente representado por, pelo menos, uma das visões narradas por algum agente do evento. Isso é um poder de representação imenso, em um festival que tem como pretensão cada vez mais expandir suas fronteiras.