Com o avanço da tecnologia e o mundo cada vez mais conectado a dispositivos móveis –sobretudo entre as novas gerações– é imprescindível que, além de ter um ótimo produto/serviço e uma boa presença online, as marcas devem saber conversar com o público e conseguir entregar experiências humanizadas e integradas.
Neste caso, além dos nomes convencionais, as marcas que mais vem se destacando são justamente as que nascem no digital, as hoje conhecidas como marcas verticais digitalmente nativas, ou DNVB.
Focadas primordialmente para a geração dos millenials e a dos nativos digitas, as digitally native vertical brands (por isso a sigla DNVB) não necessitam adaptar-se ao futuro, pois ao nascerem no âmbito digital já são consideradas como o futuro das marcas – assim como o "metaverso" já está sendo considerado como o ecossistema do futuro.
Dito isso, o que são as DNVBs e por que devemos prestar mais atenção a elas daqui em adiante?
As marcas verticais nativas digitais, ou DNVBs, são empresas que surgiram na era do comércio eletrônico, aproveitando os canais digitais para criar e vender produtos diretamente aos consumidores. Diferentemente das marcas tradicionais que dependem de intermediários como atacadistas ou varejistas, as DNVBs controlam toda a cadeia de valor, desde o design e a produção até a distribuição e o marketing.
As DNVBs mantêm o controle sobre todos os aspectos de seus negócios, o que lhes permite simplificar as operações, manter padrões de qualidade e ter uma compreensão mais profunda de seus clientes. Ao eliminar os intermediários, eles podem oferecer produtos a preços competitivos e, ao mesmo tempo, manter margens de lucro mais altas.
As DNVBs priorizam os canais digitais para a construção da marca, aquisição de clientes e vendas. Elas geralmente utilizam mídias sociais, marketing de influência e publicidade on-line direcionada para atingir seu público diretamente, ignorando os métodos tradicionais de marketing.
As DNVBs priorizam a experiência do cliente oferecendo interações personalizadas, processos de compra perfeitos e atendimento ágil ao cliente. Ao cultivar relacionamentos com seus clientes, eles podem criar fidelidade e gerar referências boca a boca.
As DNVBs aproveitam a análise de dados para entender o comportamento do consumidor, otimizar as estratégias de marketing e iterar no desenvolvimento de produtos. Ao aproveitar os insights do tráfego do site, do envolvimento da mídia social e das métricas de vendas, eles podem tomar decisões informadas para impulsionar o crescimento.
As DNVBs geralmente têm uma narrativa de marca atraente que repercute em seu público-alvo. Seja um compromisso com a sustentabilidade, um foco na habilidade artesanal ou um modelo de negócios inovador, elas usam a narrativa para se diferenciar e criar conexões emocionais com os clientes.
“As DNVBs (Digital Native Vertical Brands), nascem na internet e são um meio primário de interação, transação e storytelling para consumidores que se encontram nas plataformas online.”
De fato, o termo DNVB foi criado pelo próprio Andy Dunn, e a Bonobos, marca de moda masculina sob medida e lançada exclusivamente no digital em 2007, foi a primeira marca americana a utilizar a internet como o principal meio para storytelling, serviço, comércio e distribuição.
Conceitualmente, a DNVB é uma marca integrada verticalmente, ou seja, que estabelece a conexão direta com o cliente final e têm o controle de ponta a ponta sobre os processos de produção, marketing e distribuição. Dito isso, as DNVBs requerem a comercialização de um canal de e-commerce, porém esse canal é apenas uma camada de capacitação e não o ativo principal da marca.
Curiosamente, durante o surgimento das DNVBs, um equívoco comum era pensar que essas empresas deveriam possuir valuations parecidos aos de empresas de tecnologia. No entanto, as DNVBs funcionam mais como varejistas do que como empresas de tecnologia.
Além disso, por conta da pequena escala de muitas DNVBs, a maioria dos varejistas tradicionais ignoraram e/ou subestimar seus novos competidores no começo.
Mas, em fevereiro de 2016, a Unilever pagou US$1 bilhão para adquirir a Dollar Shave Club, DNVB americana criada em 2011 que entregava lâminas de barbear e outros produtos de higiene pessoal por correio, e, de repente, essas marcas passaram a ser observadas com outros olhos.
Assim como mencionado, as DNVBs não são um e-commerce, são um comércio vertical –um equivoco similar ocorre quando falamos que o "metaverso" é o novo varejo. Na verdade, o "metaverso" é mais um meio, porém muito mais imersivo, onde o varejo virtual pode ganhar mais força e versatilidade nos próximos anos.
Focando novamente nas DNVBs como comércio vertical, segundo Andy Dunn, as margens brutas do produto são pelo menos o dobro do e-commerce e as margens de contribuição podem ser 4 a 5 vezes maiores, transformando radicalmente a economia do comercial vertical quando comparado a do e-commerce.
Além disso, investidores precisam analisar mais de perto a matemática posterior de um DNVB em relação a um fornecedor de e-commerce terceirizado. São grandes as diferenças nas unit economics e nas coortes de margem de contribuição, sendo a análise coorte somente parte da história.
Outra grande diferença entre as duas vertentes, e talvez umas das mais importantes, é a aproximação com o cliente.
As marcas nativas digitais são extremamente focadas no consumidor e geram muito mais intimidade com o cliente do que a concorrência. Os dados são melhores porque todas as transações e interações são capturadas uma vez que não é necessário a combinação dados entre diferentes empresas, pois tudo está dentro do mesmo negócio, uma grande gestão de relacionamento com o cliente.
No geral, o produto, experiência via web/dispositivos móveis e o serviço ao cliente, juntos, se tornam a marca na imaginação do consumidor.
Por último, enquanto e-commerces competem com gigantes do setor como Amazon, Magazine Luiza e Mercado Livre, criar uma DNVB te oferece a possibilidade de combinar o crescimento de um e-commerce com as margens de ser uma marca, além de possuir mercadorias proprietárias onde você controle a distribuição e consequentemente o seu próprio destino.
Independente se a sua empresa é uma DNVB ou não, o seu produto é a fundação para a diferenciação entre marcas.
Dito isso, a obsessão com o cliente final faz com que as DNVBs centrem suas atenções em realizar algo melhor do que qualquer outro competidor como no caso, por exemplo, da Stance, empresa americana especializada em meias e roupa interior, que, como outras DNVBs que seguem o mesmo modelo, se tornou a primeira escolha na cabeça do consumidor em sua devida categoria.
Embora o crescimento das DNVBs possa ser mais lento inicialmente, esse foco permitiu que elas desenvolvessem públicos dedicados e de nicho que, posteriormente deixam de comprar das grandes marcas.
No caso do Dollar Shave Club, sua popularidade fez com que a participação da Gillette no mercado de barbeadores masculinos caísse de 70% em 2010 para 54% em 2016.
Desde o início, você precisa deixar claro qual problema o seu produto está resolvendo. Por que os consumidores deveriam comprar o seu produto? Qual o seu diferencial?
Neste caso, se você se sente pronto para enfrentar os líderes de mercado e conduzir seu setor escolhido em uma nova direção, talvez seja hora de entrar no espaço do comércio digital verticalizado.
Seja no serviço oferecido ou no próprio produto, a experiência de compra torna-se verdadeiramente única para o cliente uma vez que a marca consiga atender as necessidades únicas que cada um deles possui.
No caso da Atoms, além de oferecer calçados em tamanhos ainda mais específicos como, por exemplo, 9,25 (na escala americana), a empresa ainda permite que o consumidor experimente múltiplos pares em casa, até mesmo calçados de pares não correspondentes.
Outro exemplo, é o da marca Andie Swim. Por uma taxa extra de apenas US$10,00, a DNVB permite que seus clientes montem um pacote personalizado com roupas de banho (biquinis, maiô etc.), podendo escolher, por estilo, entre uma variedade de tamanhos e opções de cores para poder experimentar antes de eventualmente realizar uma compra.
A cadeia de fornecimento (supply chain) para as DNVBs se torna completamente diferente em comparação a uma empresa global com a Amazon, mas, quando bem feita, esse processo permitirá que a sua empresa se destaque em relação aos preços mais baixos de produtos mais genéricos.
Ao serem empresas integradas de forma vertical, ou seja, que fazem a conexão e estabelecem o relacionamento diretamente com o consumidor final, as DNVBs controlam a sua cadeia de fornecimento por completo, desde a produção/confecção do produto até que esse chegue na casa do cliente.
Por conta disso, as DNVBs são consideradas como negócios D2C (direct-to-consumer), podendo assim monitorar constantemente o seu inventário/estoque, além do feedback recebido por seus clientes para a realização de mudanças/ajustes necessários.
No entanto, esse alto volume de dados requer experiência em tecnologia para gerencia-lo de forma eficaz, e, no início, toda empresa deve construir uma equipe que tenha uma mentalidade focada no digital. Contudo, não deixe de começar algo caso você, como fundador, não possua esse conhecimento específico baseado em tecnologia.
Ao invés disso, talvez seja melhor, ao menos no início, utilizar algum software já existente para poder ao menos tirar a ideia do papel. Dito isso, certifique-se de selecionar uma plataforma que consiga dar suporte a todas as suas ideais, integre-se a aplicativos de terceiros e, principalmente, esteja devidamente equipada para o nível de personalização que os clientes esperam do seu site.
Por último, muitas marcas DNVB também utilizam sistemas de vendas online como Shopify ou Magento, ajudando a facilmente conectá-las a um público global, independentemente da moeda utilizada nas transações.
Assim como mencionamos, para as DNVBs, a internet atua como uma camada de capacitação e não o ativo principal da marca. No entanto, é essencial que você tire o máximo proveito de suas infinitas possibilidades uma vez que a internet também será o principal veículo de comunicação com o seus clientes, sobretudo com as gerações Z e millenials.
Em outras palavras, mais do que gastar e alocar recursos em canais de publicidade tradicional, você deve selecionar cuidadosamente quais serão as principais plataformas de rede social da marca.
No Brasil, segundo a StatCounter, entre dezembro de 2020 e dezembro de 2021, o Facebook concentrou mais de 55% de todas as visitas a sites de mídia social no Brasil, seguido pelo Pinterest e pelo YouTube. Além disso, em 2021, o Brasil catalogou aproximadamente 159,01 milhões de usuários de mídia social no país.
Olhemos, por exemplo, o caso da empresa de cosméticos Glossier, que construiu sua marca, quase que ao 100%, pelo Instagram. Em 2019, a fundadora Emily Weiss creditou 90% de sua receita ao fãs da plataforma que divulgaram o produto por meio de postagens.
Hoje, mais do que em qualquer outra época, o conteúdo online gerado pelo usuário age como prova social de uma experiência autêntica e positiva com um negócio, impulsionando a marca organicamente e permitindo que cresça a confiança do cliente perante a marca.
Devido ao potencial do conteúdo criado pelo consumidor e de como ele é fundamental a construção de uma audiência, diversas marcas se destacam até mesmo ao projetar a embalagem do produto para ser compartilhada nas mídias sociais, usando a aparência visual para vender e também incentivando os clientes a postarem vídeos abrindo esses pacotes.
Mesmo nascendo no âmbito digital, marcas DNVB não permanecem para sempre somente no digital. Essa incarnação offline ocorre quando a marca tem a sua própria experiência física no varejo ou em parcerias rigorosamente selecionadas.
A Kylie Cosmetics, marca de cosméticos da personalidade e modelo americana Kylie Jenner, lançada exclusivamente nas mídias sociais em 2014, hoje organiza várias lojas pop-up –lojas físicas que possuem uma data de início e de encerramento das atividades– para coincidir com novos lançamentos.
Ao também explorar o offline, as marcas tornam tangível a experiência que o cliente vive online. Além disso, abordagens como a de lojas pop-up também permitem que as DNVBs evitem contratos imobiliários de longo prazo.
No entanto, algumas empresas também começaram a estabelecer locais permanentes, como no caso da Alo Yoga, que abriu uma loja modelo em Beverly Hills, que conta com um estúdio de ioga, lounge e kombucha tem o espaço como uma extensão física da marca online, ajudando assim a fidelizar ainda mais os seus clientes.
O varejo off-line não tem a ver com o armazenamento de produtos, mas sim com o marketing da marca e a entrega de um excelente atendimento ao cliente, sejam eles pop-ups, sejam locais permanentes e/ou instalações em outros varejistas já existentes. E você sabe que descobriu isso primeiro? Steve Jobs com a Apple Store, o primeiro conceito de varejo escalável e vertical.
Além de entender as semelhanças e diferenças entre DNVBs e e-commerces, é também importante diferenciar as DNVBs dos negócios D2C.
Assim como mencionamos, ao comunicar-se diretamente como o consumidor desde o primeiro contato até a entrega do produto, as DNVBs acabam adotando um modelo de distribuição D2C. No entanto, marcas D2C não são necessariamente DNVBs.
Para entender a diferença, utilizemos dois exemplos: a Burrow, DNVB americana fundada em 2016 que oferece móveis e sofás customizados, e a Jeni’s Splendi Ice Cream, sorveteria americana fundada em 2002 com forte presença tanto no presencial como no online.
Embora as DNVBs existam nos Estados Unidos há mais de uma década e tenham –ao menos no mercado de vestuário e calçados– possivelmente conseguido o aumento de 20% em vendas em 2021 (simbolizando US$8,4 bilhões), segundo a Coresight Research, tanto na Europa como no Brasil o mercado ainda está aquecendo.
Um case de sucesso no Brasil é o da Amaro, empresa de moda feminina, calçados e acessórios fundada em 2012. Após construir uma forte presença online –oferencendo 10 mil produtos de mais de 150 marcas em seu e-commerce até o primeiro semestre de 2021– a marca também migrou para offline e hoje possui 16 lojas de varejo.
Dito isso, uma curiosidade sobre a Amaro é que suas lojas físicas possuem computadores para que os clientes possam realizar seus pedidos e recebê-los em suas casas.
“Em um marketplace horizontal, você sabe o que quer e já coloca no campo de buscas. Na Amaro, que tem um marketplace verticalizado, a ideia é que você entre em cada categoria e descubra marcas, como se passasse por prateleiras.”
Outras DNVBs brasileiras que já fazem sucesso são a Zissou (colchões), Dr. Jones (higiene e beleza masculina), Lovin' Wine (vinhos em lata) e LivUp (alimentos saudáveis e orgânicos).
Apesar de todas as vantagens anteriormente citadas, ser uma marca nativa digital, mesmo que vertical, não significa que os desafios não aparecerão. As DNVBs ainda sofrerão a ameaça dos grandes e-commerces como Amazon, Mercado Livre, Magazine Luize, Alibaba, que não só dominam o marketshare, como vem crescendo cada vez mais nos últimos anos.
Além de que a própria marca seja um diferencial das DNVBs, as empresas que sigam esse modelo de negócio devem oferecer algo único. Escolhendo pontos de venda como preço, qualidade, experiência ou suporte, as DNVBs precisam se ater ao que diferencia a marca e o seu produto para poder se destacar da concorrência.
As DNVBs são atraentes porque vendem produtos por um custo mais acessível e oferecendo uma maior qualidade, porém precisam se atentar ao fato de que os investimentos feitos em experiências e produtos personalizados podem acabar gerando custos de produção mais elevados.
Fora isso, pudemos observar que, ao menos nos Estados Unidos, a pesar das vendas via e-commerces terem aumentado substancialmente nos últimos dois anos, ainda existe um grande apelo pela varejo tradicional, pois permite que consumidores interajam diretamente coma marca, produto e vendedores.
Dito isso, certas DNVBs, já vem oferencendo seus produtos no offline, seja tendo lojas física (como a Amaro), com lojas pop-up (como a Kylie Cosmetics), ou até mesmo nas prateleiras de lojas como a Target. Independentemente disso, a experiência da marca em qualquer um desses canais deve ser perfeita.
As DNVBs, sobretudo no Brasil, estão apenas começando e o seu grande potencial de escala começa a ser percebido por mais pessoas.
Sua estratégia cria uma fidelidade à marca quase impossível de ser criada por outras marcas mais tradicionais (sobretudo e-commerces) e, à medida que o varejo vertical tradicional "perde" espaço para abordagens focadas no digital, as DNVBs surgem para ocupar seu lugar.
Ainda assim, há muito o que se provar sobre a lucratividade das DNVBs.
Nós estamos na primeira década de uma mudança de um século em que o varejo está se reorganizando das vendas físicas (século XX) para as vendas via smartphone (século XXI).
As marcas verticais, impulsionadas pelas lojas físicas tradicionais (por exemplo, Zara, Ikea, Trader Joe’s), tiveram um papel importante na era do varejo. Agora, suas reencarnações digitais se tornam a história principal do futuro do varejo.